Quem sou eu

Belém/Ribeirão Preto, Brazil
Amazônida jornalista, belemense papa-xibé. Mãe, filha, amiga... Que escreve sobre tudo e todos há décadas. Com lid ou sem lid e que insiste em aprender mais e mais... infinitamente... Até a morte

Aos que me visitam

Sintam-se em casa. Sentem no sofá, no chão ou nessa cadeira aí. Ouçam a música que quiser, comam o que tiver e bebam o que puderem.
Entrem...
Isso aqui está se transformando em um pedaço de mim que divido com cada um de vocês.
Antes de sair me dê um abraço, um afago e me permita um beijo.

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domingo, 29 de junho de 2008

Pelas estradas de SP

Eu que sempre fui tão medrosa,uma criança cheia de medos bobos e agora me descubro tão corajosa. Tinha medo de avião, de escuro, dentista, de médicos e exames, de barata (ainda tenho!) e até do apito do guarda-noturno ou de ligar um ferro de passar na tomada. Nem me reconheço nesses últimos meses.
Tenho circulado com relativa facilidade entre Leme, Campinas e São Paulo. Andado de metrô, a pé pela cidade que tanto me metia medo. Simplesmente irreconhecível.
A descoberta do câncer de mama em setembro do ano passado, depois do susto, do medo de morrer no dia seguinte,de não ver a Anaterra fazer 15 anos, de não sentir a alegria do Raul em ser aprovado em um vestibular, uma força inexplicável se apossou de mim. Uma vontade de viver que nunca tive, uma esperança inabalável, um futuro que não parece tão longo, mas que estou procurando viver intensamente.
Muitas vezes, principalmente nas longas horas de insônia, paro pra avaliar a metamorfose. Deixar Belém, a nossa casa, animais, minha mãe, irmãos,sobrinhos, amigos, meus alunos e tudo mais que são marcas registradas na minha história, não fazia parte de meus planos. Tínhamos uma vida tão arrumadinha e de repente o que era tão relevante é agora secundário. Quero só viver, quero apenas que o Manoel viva e que nossos filhos estejam conosco, felizes. Independente de onde e como.
Ontem estava mal. Pela primeira vez conversei com a chefa da equipe multidisciplinar que está cuidando do Manoel desde que ele chegou há quase dois meses. Não me escondeu nada e deixou claro que a pneumonia, difícil de ser debelada,está alterando toda a programação. Está necessitando de máscara de oxigênio o dia todo, fazendo fisioterapia pulmonar, tentativas de reabilitação do pulmão, agora sua grande fragilidade. As plaquetas estão baixas e os sangramentos são freqüentes. Sangra o nariz onde estavam os cateteres do oxigênio, sangra nas fezes, sangra depois que tira a máscara da fisioterapia. Sente-se cansado com facilidade e o inchaço das pernas e braços o deixa ainda mais debilitado, quase impossível caminhar.
O quadro que se agravou fez o transplante ser suspenso. Precisa antes se fortalecer, curar a pneumonia. Provavelmente a medula da Dé será congelada e implantada nele no momento oportuno.
Mas nem tudo é ruim. Temos que comemorar cada vitória, cada conquista e a uma das maiores agora é autorização que foi dada para que o transplante aconteça pelo plano. Não sei bem como foi a negociação com a Embrapa, sei apenas que a colega Jandete nos deu a boa notícia que será oficializada nesta segunda-feira. Não precisaremos entrar na justiça. Uma preocupação a menos.
Hoje, um telefonema de manhã cedo, antes do horário de visita quando podemos entrar no hospital, indicava que ele estava melhor. Aprendi a sentir pela voz como ele se encontra. Decidimos então, eu, a Anaterra e a irmã-doara, a Dé, sair um pouco. Aproveitar o sol que brilha lá fora. O primeiro dia quente desde que chegamos a SP. A feirinha da Liberdade nos encheu os olhos e a boca. Um pedacinho do mundo oriental a nossa disposição. O tempo passou rápido e o melhor foi encontrar o Manoel mais disposto e ouvir da médica que ele melhorou muito. Ouviu os pulmões e o som indicou que está com menos chiado. Comeu mais e está falando até em tomar um bom banho.
A nossa presença o deixa mais feliz, mais disposto. Imagino que muita coisa ruim passa pela cabeça dele quanto tem tempo de sobra pra pensar. O Pedro, irmão dele, tem sido incansável, um ajuda e tanto e nós tentamos complementar o que ele lhe oferece. Fazemos massagem, damos a comida na boca, incentivamos para que saia da cama e isso lhe dá uma injeção de ânimo incontestável.
O meu pessimismo de ontem, liberado em um telefonema para a amiga e paciente Ieda, felizmente me abandonou hoje. Estou mais confiante de que isso tudo são fases e que teremos que saber enfrentar, tentar minimizar para não desanimar, acreditar que será possível vencer, que não vamos sucumbir por mais difícil que esteja sendo.
Quero muito que a nossa vida recomece, que possamos estar todos juntos em breve em uma casinha ensolarada e florida em São Carlos, vindo a SP só para passear e eventualmente para realizar exames de controle.
Preciso acreditar que essa mudança radical é um jeito estranho que Deus encontrou de podermos oferecer melhores oportunidades para os nossos filhos. Sempre gostei de estudar, sempre acreditei que ir além, que progredir tem relação direta com o conhecimento. Não pude estudar tudo o que queria, mas quem sabe meus filhos conseguem. O Raul está levando a sério o terceiro ano do ensino médio e comentou que deverá fazer vestibular para educação física e motricidade humana e quer se especializar em fisiologia do exercício na Universidade de São Carlos. Um sonho impensável em Belém.
Não sei o que o futuro me reserva (ninguém sabe...), sei apenas que continuarei buscando a minha felicidade onde ela esteja.
Hoje estou feliz. Mesmo dentro do Hospital do Câncer, mesmo ouvindo o barulhinho da máquina que leva ar para o pulmão do Manoel, mesmo distante da minha Belém e dos meus familiares, mesmo sabendo que irei dormir mais uma noite em um hotel, mesmo não tendo um lar neste momento.
Estou feliz porque estou viva, o Manoel está melhor, a Anaterra está aqui do meu lado e logo logo o Raul se juntará a nós. Uma família fragilizada pela doença, mas que está acreditando no dia de amanhã, no novo dia que nascerá.

Pelas estradas de SP

Eu que sempre fui tão medrosa,uma criança cheia de medos bobos e agora me descubro tão corajosa. Tinha medo de avião, de escuro, dentista, de médicos e exames, de barata (ainda tenho!) e até do apito do guarda-noturno ou de ligar um ferro de passar na tomada. Nem me reconheço nesses últimos meses.
Tenho circulado com relativa facilidade entre Leme, Campinas e São Paulo. Andado de metrô, a pé pela cidade que tanto me metia medo. Simplesmente irreconhecível.
A descoberta do câncer de mama em setembro do ano passado, depois do susto, do medo de morrer no dia seguinte,de não ver a Anaterra fazer 15 anos, de não sentir a alegria do Raul em ser aprovado em um vestibular, uma força inexplicável se apossou de mim. Uma vontade de viver que nunca tive, uma esperança inabalável, um futuro que não parece tão longo, mas que estou procurando viver intensamente.
Muitas vezes, principalmente nas longas horas de insônia, paro pra avaliar a metamorfose. Deixar Belém, a nossa casa, animais, minha mãe, irmãos,sobrinhos, amigos, meus alunos e tudo mais que são marcas registradas na minha história, não fazia parte de meus planos. Tínhamos uma vida tão arrumadinha e de repente o que era tão relevante é agora secundário. Quero só viver, quero apenas que o Manoel viva e que nossos filhos estejam conosco, felizes. Independente de onde e como.
Ontem estava mal. Pela primeira vez conversei com a chefa da equipe multidisciplinar que está cuidando do Manoel desde que ele chegou há quase dois meses. Não me escondeu nada e deixou claro que a pneumonia, difícil de ser debelada,está alterando toda a programação. Está necessitando de máscara de oxigênio o dia todo, fazendo fisioterapia pulmonar, tentativas de reabilitação do pulmão, agora sua grande fragilidade. As plaquetas estão baixas e os sangramentos são freqüentes. Sangra o nariz onde estavam os cateteres do oxigênio, sangra nas fezes, sangra depois que tira a máscara da fisioterapia. Sente-se cansado com facilidade e o inchaço das pernas e braços o deixa ainda mais debilitado, quase impossível caminhar.
O quadro que se agravou fez o transplante ser suspenso. Precisa antes se fortalecer, curar a pneumonia. Provavelmente a medula da Dé será congelada e implantada nele no momento oportuno.
Mas nem tudo é ruim. Temos que comemorar cada vitória, cada conquista e a uma das maiores agora é autorização que foi dada para que o transplante aconteça pelo plano. Não sei bem como foi a negociação com a Embrapa, sei apenas que a colega Jandete nos deu a boa notícia que será oficializada nesta segunda-feira. Não precisaremos entrar na justiça. Uma preocupação a menos.
Hoje, um telefonema de manhã cedo, antes do horário de visita quando podemos entrar no hospital, indicava que ele estava melhor. Aprendi a sentir pela voz como ele se encontra. Decidimos então, eu, a Anaterra e a irmã-doara, a Dé, sair um pouco. Aproveitar o sol que brilha lá fora. O primeiro dia quente desde que chegamos a SP. A feirinha da Liberdade nos encheu os olhos e a boca. Um pedacinho do mundo oriental a nossa disposição. O tempo passou rápido e o melhor foi encontrar o Manoel mais disposto e ouvir da médica que ele melhorou muito. Ouviu os pulmões e o som indicou que está com menos chiado. Comeu mais e está falando até em tomar um bom banho.
A nossa presença o deixa mais feliz, mais disposto. Imagino que muita coisa ruim passa pela cabeça dele quanto tem tempo de sobra pra pensar. O Pedro, irmão dele, tem sido incansável, um ajuda e tanto e nós tentamos complementar o que ele lhe oferece. Fazemos massagem, damos a comida na boca, incentivamos para que saia da cama e isso lhe dá uma injeção de ânimo incontestável.
O meu pessimismo de ontem, liberado em um telefonema para a amiga e paciente Ieda, felizmente me abandonou hoje. Estou mais confiante de que isso tudo são fases e que teremos que saber enfrentar, tentar minimizar para não desanimar, acreditar que será possível vencer, que não vamos sucumbir por mais difícil que esteja sendo.
Quero muito que a nossa vida recomece, que possamos estar todos juntos em breve em uma casinha ensolarada e florida em São Carlos, vindo a SP só para passear e eventualmente para realizar exames de controle.
Preciso acreditar que essa mudança radical é um jeito estranho que Deus encontrou de podermos oferecer melhores oportunidades para os nossos filhos. Sempre gostei de estudar, sempre acreditei que ir além, que progredir tem relação direta com o conhecimento. Não pude estudar tudo o que queria, mas quem sabe meus filhos conseguem. O Raul está levando a sério o terceiro ano do ensino médio e comentou que deverá fazer vestibular para educação física e motricidade humana e quer se especializar em fisiologia do exercício na Universidade de São Carlos. Um sonho impensável em Belém.
Não sei o que o futuro me reserva (ninguém sabe...), sei apenas que continuarei buscando a minha felicidade onde ela esteja.
Hoje estou feliz. Mesmo dentro do Hospital do Câncer, mesmo ouvindo o barulhinho da máquina que leva ar para o pulmão do Manoel, mesmo distante da minha Belém e dos meus familiares, mesmo sabendo que irei dormir mais uma noite em um hotel, mesmo não tendo um lar neste momento.
Estou feliz porque estou viva, o Manoel está melhor, a Anaterra está aqui do meu lado e logo logo o Raul se juntará a nós. Uma família fragilizada pela doença, mas que está acreditando no dia de amanhã, no novo dia que nascerá.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Liminar para garantir o transplante

Sempre pensei demais, sempre fiz exercícios mentais intensos para melhor compreender a mim e aos outros. Sempre acreditei que tudo tem explicação, mesmo quando ela aparentemente não existe. Fico perplexa agora ao constatar que mesmo diante de tantas experiências novas, de tanto sofrimentos, de tantas mudanças, tudo vai se ajeitando, tudo se encaixa como um grande quebra-cabeça. Peças que pareciam antagônicas, tão distantes, se atraem e se unem harmoniosamente.
Assim está a minha vida, assim está a nossa vida.
Neste momento estou em Leme, na casa do meu irmão contando com a solidariedade e grande ajuda da cunhada Dóris. Uma das pessoas que têm se revelado presente, amiga, solidária. Na sala ao lado a Anaterra, a filha que representa para mim nesses dias o maior laço de família. É quem está ao meu lado 24 horas. É quem sofre com as minhas explosões, com o meu estresse, com as minhas lágrimas. Está ficando adulta precocemente. Só tem 12 anos, mas fala muitas vezes como gente grande sobre móveis, imóveis, exames do Manoel ou tenta me consolar diante de uma notícia desagradável vinda do hospital. Tenho tentado minimizar esses dias para ela e para mim. Passeios, compras necessárias e comidinhas especiais que embora não resolvam, minimizam.
Cada dia é um novo cenário repleto de situações esdrúxulas e às vezes desanimadoras. Depois a boa notícia da superação. Temos convivido com quadros que pareciam impossíveis até então. O Manoel está lutando a cada segundo pela vida. A quimioterapia, ao mesmo tempo que é o coquetel de drogas que pode salvá-lo, é também o motivo da debilidade. Está com limitações respiratórias, fica ofegante com facilidade e tem feito o que eles chamam de “fisioterapia pulmonar”. Uma hora pela manhã, outra à tarde e outra à noite de máscara com oxigênio para fortalecer os pulmões e reduzir a falta de ar. Continua inchado (pernas, braços, barriga), com diarréia e uma aparência que choca. Mas todos dizem: é assim mesmo. É preciso ter paciência e fé.
Agora mais do que nunca. Depois de tantas etapas vencidas teremos que enfrentar um novo round: a justiça.O plano de saúde (Unimed Paulistana), assim como a grande maioria ou talvez todos, não cobre os transplantes de medula óssea do tipo alogênico, aquela que vem de outro doador. Só garante o auto-transplante. Estamos em um dos hospitais de referência nessa área no Brasil, na América Latina e se duvidar no mundo, uma vitória para quem saiu de Belém a mais de 3 mil km; depois encontrar uma doadora compatível que já está em São Paulo iniciando os exames, afinal a Dé se submeterá a uma cirurgia para a retirada do material da coluna, de repente surge mais uma pedra no caminho. Só com uma liminar é que a Unimed autorizará o transplante.
Nem acreditei quando ouvi esse absurdo. Quanta incoerência ! Por que tantas campanhas para doação de medula se não há cobertura para o transplante ? De que adianta tanta mobilização em torno de uma compatibilidade se, mesmo havendo doador e receptor, o transplante não pode acontecer ?
O Pedro, irmão do Manoel que o acompanha desde a chegada a São Paulo, já está se inteirando sobre como proceder e, tão logo o plano oficializa a negativa (até agora foi tudo verbal), ele entrará na justiça.
Não posso assumir esse ônus. Tenho, nos próximos dias, um compromisso inadiável com a minha saúde também. Preciso retomar meu tratamento e cuidar de mim para melhor cuidar do Manoel, do Raul, da Anaterra, da mamãe e de mim. A fortaleza é só aparente. Não gosto de ver meu marido daquele jeito. Um bebê em tamanho de homem. Está totalmente dependente até para ir ao banheiro, para tomar um iogurte e até para respirar melhor. Pés e mãos inchados, avermelhados; braços cheios de hematomas com manchas de sangue retrato das veias estouradas. Nem de longe lembra o homem brincalhão, sorridente, irritado no trânsito, exigente como pai, amigo de todos. Está frágil e às vezes desanimado como se não quisesse continuar a luta. Precisa de nossa força, nosso estímulo, nossa presença. Entretanto tivemos que deixá-lo naquele hospital.
Saimos de São Paulo na terça-feira (24) e ontem voltei à clínica onde em abril iniciara o tratamento de radiação na mama esquerda. Fui muito bem recebida e me aguardava uma notícia que me ajudará a exercita mais ainda a sair do foco da morte e acreditar que nem tudo está perdido. A explicação convincente do médico radioterapeuta novamente me explicitou a distância que nossa Belém tem dos centros mais desenvolvidos. Quando, há seis meses se falou em Campinas em braquiterapia como uma substituição à radioterapia tradicional, alguns dos médicos que me acompanham desde o início manifestaram-se contrários. Acredito agora que um posicionamento baseado no desconhecimento. Ontem, após ouvir atentamente o especialista, fiquei convencida de que de fato essa opção é a mais compatível com o meu caso.
Ele, didaticamente, explicou a diferença básica entre uma técnica e outra e com muita segurança me persuadiu a optar pela braquiterapia. Uma pequena intervenção cirúrgica instalará na minha mama esquerda uma espécie de cateter que conduzirá a radiação em maior quantidade e bem direcionada ao quadrante onde estava alojado o nódulo maligno. Além de ser uma dose mais concentrada e maior, a braqui acontece em cinco dias consecutivos e não 33 sessões como a radio tradicional. Ficarei com mais tempo para o Manoel, para as mudanças, para a instalação de nossa nova casa. Outro fator importante, elencado pelo médico: não há necessidade de eu receber uma radiação tão grande que poderá atingir coração e pulmão desnecessariamente. Concordei e apenas aguardo o dia em que tudo isso começará. Existe grande probabilidade de ser já na próxima segunda-feira.
Enquanto essa nova etapa não inicia, fico em Leme curtindo muito frio, escrevendo, lendo, conversando com a Doris e me organizando para este final de semana ver novamente o Manoel e na quinta-feira próxima abraçar o Raul. Uma semana longe dele e já começa a incomodar.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

O texto da Brenda

Os que têm me acompanhado através desse blog sabem o quanto tenho enaltecido e sido grata a todos os amigos, colegas, conhecidos, vizinhos e parentes (meus e do Manoel) que têm, de uma diversidade enorme de formas, nos ajudado e transformado, principalmente esse último mês em uma fardo mais leve. São manifestações que nos preenchem e nos dão a certeza de que não estamos sós, que a torcida é grande, que a fé inabalável, que os corações, em momentos como esses, se unem e batem em um só acorde. Pessoas que são amigas de muitas décadas, outras que surgiram mais recentemente em nossas vidas. Outras que nem conheço bem, que a Internet colocou em nossos caminhos.
Os telefonemas e mensagens têm permitido que os contatos sejam mais freqüentes e nos dão a certeza da proximidade, da amizade, do carinho. Selecionei uma para, simbolicamente, homenagear e agradecer as todos vocês, a todos os que têm sido amigos de fato. Amigos que entendem o momento, que nos amparam, entendem nossas fraquezas, nossas oscilações de humor, nossas limitações, nossos medos, nossos sonhos, nossas lágrimas, nossos sorrisos.
A mensagem é linda e muito bem redigida.
A autora é uma jovem jornalista. Jornalista no sentido mais amplo e belo da palavra. Foi estagiária da Embrapa, durante algum tempo ficou conosco na Área de Comunicação. Sua competência, carisma, meiguice, delicadeza e educação a tornam um dos mais queridos filhos profissionais que já tive.
Emocionante e belo o texto da Brenda Taketa.

Oi D. Ruth, querida,
Me desculpe pela demora em escrever. Acho que, de certa forma, estava adiando a 'despedida' (por mais que, de coração, acredite que será temporária), para não repetir aquela sensação assustada - e devo confessar, esgoistamente triste - que me pegou, quando a senhora me abraçou na Embrapa ao anunciar a sua mudança.Quero lhe dizer que, profissionalmente, a senhora é uma dos maiores orgulhos e melhores alegrias assinaladas no meu currículo. Pessoalmente, uma das referências de ser humano que guardo em uma listinha especial, da qual poucos fazem parte, por sua incrível habilidade em cativar as pessoas com graça, leveza e simplicidade e pelos bons exemplos ao demonstrar sensibilidade sem deixar de ser forte, generosidade apesar das dificuldades e otimismo, mesmo quando o mundo não se mostra o melhor.Este 'até breve' segue com a grata certeza de que logo a senhora estará conosco, ocupando um espaço que é só seu (por mérito, direito, fato e competência) e nos brindando com o mesmo jeito falante, alegre, e bem-humorado. Talvez Deus tenha resolvido, por um tempo, agraciar os paulistas com a sua presença. Onde estiver, saiba que conta com a minha amizade, carinho, confiança e admiração. Também me coloco à disposição, para qualquer ocasião em que lhe possa ser útil.

Desculpe se pareço exagerada, mas quem convive com a senhora dificilmente não sente desta forma.

Fique bem.
beijos,

Brenda

domingo, 22 de junho de 2008

No frio de sampa

Quatro dias de muito frio e um universo que aos poucos vai se desvendando. Ora alegremente ora tão tristemente. Chegamos na manhã da quinta-feira, dia 19. Encontramos uma cidade com temperatura em torno de 15º C. Frio demais para duas paraenses que deixaram Belém com mais ou menos 30º e muita umidade. Na barriga o friozinho do desconhecido, do que estava fazendo, do receio de estar errada ao tomar tantas decisões profundas e radicais. Tenho pensado muito nisso, nessa impetuosidade do fazer, do mudar, do querer viver. Hoje estou vendo a vida de outra forma, reavaliando quase tudo, supervalorizando o que era tão insignificante e desconsiderando o que antes parecia tão imprescindível.
Surpreendo-me com a naturalidade com que estou vivendo todas essas mudanças. O ambiente de um hospital sempre me assustou, me causava muito incômodo. Agora estou passando meus dias em um que trata especificamente de câncer onde se encontra, a cada passo, pessoas em tratamento ou parentes e amigos com semblantes entristecidos.
Felizmente é tudo tão diferente do Ophir Loyola. Aqui é o acesso ao tratamento de saúde que todos queremos, que temos direito e que deveria ser oportunizado a qualquer cidadão brasileiro. Sinto-me privilegiada por estar neste meio e sem despender um centavo. Cheguei a comentar com o Manoel essa coincidência tão bem-aventurada que nos trouxe pra cá. Os profissionais, além de extremamente capacitados, são humanos. Conversam, sorriem, explicam com paciência e objetividade o que estamos passando. O que significa cada exame, cada medicamento. Querem saber tudo o que o paciente sente e levam à risca as recomendações pra evitar novas infecções.
O local é limpo, bonito, arejado e faz bem aos olhos. Não há pacientes em macas espalhadas pelos corredores ou longas filas de espera. Sinto-me no primeiro mundo. Fica evidente que aqui o Manoel terá todas as chances para se curar. Uma cura difícil, que levará muito tempo, que exigirá muita paciência de todos nós, mas que nada me fará desistir.
Sua aparência é de um homem muito mais velho, apenas alguns fios brancos de cabelo na cabeça e no rosto. Nada lembra a barba espessa que sempre foi a sua marca. Pálido, quilos a menos e com oscilações de disposição. Há medicamentos que o deixam completamente prostrado, quase imóvel. Não fala, não quer comer e só dorme ou finge dormir solitário em seus pensamentos que raramente extravasa, compartilha com alguém. A febre, que todos torcem para que desapareça, mas que insiste em surgir pelo menos uma vez ao dia, anunciando assim que ainda há infecção, também o deixa muito indisposto. Chega a ter tremores. Uma cena dura de se presenciar. Para os médicos nada é novidade. Tudo é dentro do esperado, embora o ideal fosse que a febre não existisse. Ele precisa estar bem para se preparar para receber a medula da irmã. Outra etapa que nos reserva muita apreensão e expectativa.
Nada porém tem me assustado, me deixado alarmada, desesperada.
Hoje me emocionei particularmente com a presença de um grupo do tipo Doutores da Alegria. O Manoel já está no andar dos transplantados (os que receberão a medula ou que já receberam) e neste também está a Pediatria. Crianças que mal nasceram e já estão brigando pela vida. Todas com câncer. Chorei quando fui abraçada por aqueles jovens que poderiam estar no shopping, em uma balada ou namorando, mas que resolveu doar seu domingo aos que necessitam de alegria pra enfrentar tanta dor, tanta tristeza. Rostos pintados, violão, roupas coloridas e uma solidariedade que emociona, que dá orgulho do ser humano.
Ficarei em São Paulo, capital, até a próxima terça-feira quando seguiremos para Leme. Lá terei o colo do Ruy, da Dóris que tem sido parceira, amiga, sempre presente, tão prestativa e da Ana Júlia com seu sorriso calmo e jeito meigo de ser.
Na quarta tenho a primeira consulta de retorno na clínica de Campinas onde retomarei a radioterapia. Imaginar que há pouco mais de um mês eu via a radioterapia com medo, como algo tão danoso e complicado... Mudei sim. Mudei meu olhar para com a vida. Reaprendo, a cada minuto, o quanto ela é importante, o quanto priorizamos o banal e sufocamos o vital. Não sei ainda quando retornarei para Sampa, quando viremos (eu e a Anaterra) novamente para o hospital. Sei apenas que serão poucos dias longe do Manoel, agora já são poucos quilômetros a nos separar.
Estou sem endereço fixo, sem casa, quase sem rumo.
Hoje estou no bairro da Liberdade (chegamos a ver o Príncipe do Japão quando visitou o local parte das comemoração do centenário da imigração japonesa); depois de amanhã em Leme; na quarta em Campinas. Meu marido continuará aqui, minha filha estará comigo, meu filho a mais de 3 mil km junto com a minha mãe que também ficou. Há um ano era tudo tão diferente ...
Dentro de mais alguns dias, além do Manoel no hospital, da minha radioterapia, terei que me organizar para também decidir coisas mais práticas. Alugar um apartamento em São Carlos, conhecer os colégios onde potencialmente os meninos estudarão, tentar transferir minha perícia do INSS para Campinas ou mesmo São Paulo e o mais complicado e estafante, embora seja também muito prazeroso, montar o nosso cantinho. Não trouxe nenhum móvel e nem chegará este ano qualquer mobília. Vendi o que pude. Apenas parte da nossa história permanece em Belém. Não tenho idéia de até quando. Tudo é muito indefinido. Quanto tempo ficaremos por aqui, quando voltaremos a Belém, como nossa vida se ajeitará daqui pra frente. Não sei... não sei...
Na verdade ninguém sabe, mas a proximidade com a morte nos dá essa certeza da mortalidade, da efemeridade. Somos todos mortais, por mais que a gente nunca queira ver, nunca trabalhe com a hipótese de que amanhã poderemos não estar mais neste plano. A diferença agora é que a probabilidade é real, está muito perto. Só os que vivem essa experiência sabem exatamente o que estou falando. Antes nos imaginávamos imortais. Os planos eram todos a longo prazo. Muito ainda por fazer. Diferentemente deste momento. A casa, os cachorros, as roupas, a Tv de 29’ ou o freezer novo são tão supérfluos diante deste novo mundo de incerrtezas.
O homem com quem tive dois filhos, com quem convivo há 18 anos, o amigo que tanto me respeita e me incentiva, o companheiro que me ajudou e me suportou esses anos todos, agora está ali imóvel, apático, tão frágil. Já não brigamos porque deixo vidros de remédio ou garrafas sem a tampa ou porque ele sempre se atrasa nos compromissos. Não implica mais com o meu jeito de falar alto e nem eu com as latinhas de cerveja que toma. Somos apenas um casal que espera.
Esperamos pela chegada dos médicos, pela comida, pela bolsa de plaqueta, pelas novas picadas na pele já escura de tantos hematomas.
Esperamos pelas boas notícias que nem sempre chegam.
Esperamos pela medula e que tudo corra bem com a irmã dele.
Esperamos pela vida que nunca esteve tão em risco como agora.
Esperamos apenas viver ...

quinta-feira, 19 de junho de 2008

O começo da mudança

O começo da mudança
Aproveito as três horas e meia de vôo de Belém para São Paulo para escrever, arrumar a cabeça, pensar um pouco. Tenho tido pouco tempo pra isso. Estou no vôo JJ 3639 da TAM. Ao meu lado a Anaterra dormindo. Bem que gostaria de imitá-la, nas não consigo. Já consigo ficar menos tensa a tantos mil pés, mas não o suficiente para adormecer. Mesmo assim é uma rara oportunidade para rever emoções, arrumar idéias, reavaliar planos, pesar as decisões muitas vezes tomadas quase impulsivamente.
Preciso compreender com maior exatidão e com todas as implicações que isso significa, que estou mudando minha vida literalmente. Não estou apenas deixando Belém, estou abrindo mão de muitas conquistas, de muitos amigos, dos parentes próximos, do conforto de uma casa grande e que foi montada, em cada centímetro principalmente por mim. Agora ela é apenas em parte minha. Logo logo terá a “cara” da Socorro e do Rulton. Aos poucos perderá nossos traços.
Ver o Manoel e cuidar de mim, contudo, é o que prioritário neste momento. De nada adiantará o que conseguimos gerar materialmente se não estivermos vivos e bem para usufruir. Amanhã conseguiremos tudo de volta. Ou não, Mas de novo tentaremos ser felizes.
Tentei preparar a Anaterra para o encontro que acontecerá dentro de algumas horas. Não sei, porém, se eu estou preparada para encontrar aquele homem forte, gordo, risonho já abatido pela doença, pálido e com dificuldade para se locomover e até mesmo falar. Preciso acreditar que estamos investindo pesadamente no combate de um mal cruel e que dizima sem piedade um corpo que até recentemente era aparentemente tão saudável. As incontáveis latinhas de cerveja solenemente saboreadas nos finais de semana em nenhum momento podiam insinuar que algo de muito grave acontecia em seu sangue. As comidas pesadas que sempre foram as suas preferidas (feijoada, maniçoba, caranguejo, carne seca, bolinhos...) nem de longe acusavam que seus leucócitos e plaquetas estavam no fim. Hoje ele tenta renascer.
Simbolicamente ele é hoje uma árvore que um dia foi frondosa, viçosa, sadia, mas que foi podada quase integralmente numa tentativa de rebrotar, se reerguer. Está recebendo fertilizantes fortes e de última geração, Luiz, água com a precisão que só a Ciência permite e com a crença de todos nós que aos poucos novos folíolos surgirão que em seguida se transformarão em folhas, em galhos e em um caule vigoroso novamente. Uma nova árvore rebrotará.
Vencer cada uma dessas etapas, sabemos, será doloroso e muito difícil. A medula dele deixará quase de existir e em seu lugar a da irmã tentará produzir novos glóbulos brancos e vermelhos e plaquetas. Tenho consciência que encontrar uma doadora compatível em tão pouco tempo é a maior de todas as vitórias nessa fase. Porém, receber a medula não é a cura imediata. Muitos dias, meses e talvez anos ainda serão necessários para que ela volte a se comportar como uma parte de seu corpo. Outros órgãos reagirão, vão se revoltar ao acreditar que a medula da Dé é um corpo estranho e tudo farão para expulsá-la. Muitas idas e voltas nos esperam. Muito sofrimento também ao vê-lo sofrer tanto para continuar vivendo. Independente de saber de tudo isso, estou confiante. Acredito nos médicos e no tratamento que está sendo ministrado em São Paulo. A decisão quase intuitiva de encaminhá-lo ao A C Camargo foi a primeira grande vitória. Agora é pedir a Deus que continue nos mostrando os caminhos certos, protegendo nossas decisões e abençoando os médicos que estão a sua volta.
Sei que ficarei dividida. O Raul não estará conosco ainda. Serão 15 dias de espera e muita ansiedade, preocupação. Onde estará, com quem estará, o que estará fazendo ? Fiz mil recomendações e ele prometeu cumprir todas. Mas sei, de antemão, que não será assim. Ele é jovem e como todos – um dia já tão longínqüo eu também já fui – quer vencer limites, experimentar, se testar e testar os outros. Mais do que nunca a minha versão telemãe e a agora mãe cibernética entrará em ação.
Não sei como serão meus próximos dias. Sei apenas que ficarei um hotel próximo ao hospital durante os próximos cinco dias. De São Paulo marcarei o meu retorno na clínica de Campinas onde farei a radioterapia e em função desse calendário decidirei o restante. Uma ida a Leme, à casa do meu irmão, é essencial. É lá que ficará grande parte da enorme bagagem que levamos conosco nesse vôo. Felizmente amizades facilitaram a liberação. Os amigos, nesta história quase surrealista têm sido um capítulo à parte, Incansáveis e de todas as formas nos ajudando, têm amenizado a dor e os afazeres que parecem não terminar nunca.
Preciso também me programar para ir a São Carlos, minha próxima morada. Embora só comece a trabalhar oficialmente em outubro, as articulações para a minha transferência já estão acontecendo. Novamente entram em cena os amigos, dessa vez os da Embrapa. Esses que durante duas décadas e meia aprendi a respeitar e com quem tanto aprendi e não apenas profissionalmente. Os contatos, em diferentes níveis, têm indicado que poderei fazer um bom trabalho nessa nova casa. Sei que os desafios serão enormes, Ao contrário da Renata, Ana Laura, Vanessa, Célia, Kátia e Izabel (as profissionais de Comunicação de Belém) encontrarei pessoas que não conheço que terei que desvendar e aprender a conviver no dia-a-dia. Nada que me assuste, contudo. Comunicação Interna, relacionamento com a Mídia, Media Training ou qualquer outro segmento da comunicação institucional vai me dar prazer em atuar. Trabalhar é me sentir viva, é estar ativa, é não envelhecer mentalmente.
Ainda falta mais de uma hora para o avião pousar em Guarulhos. Muito pouco, porém, diante da distância que há algumas horas nos separava do Manoel. Sei que ele ficará feliz com a nossa presença, sei que se animará em ver a Anaterra e isso é imprescindível para seu estado geral. Precisa ficar animado, acreditar, querer vencer essa luta que nunca imaginamos nos abateria duplamente.
São Paulo; nos aguarde !

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Ainda em Belém

Para os amigos que acreditam que a essa hora eu já estivesse em território paulista sentindo muito frio, informo que ainda estou na nossa abafada Belém. Não foi possível, até o momento, antecipar a data da viagem. O fato de as passagens serem uso de milhagens exige um prazo maior, mas a colega Débora, da Embrapa, está se movimentando como sempre em busca dessa alteração. Enquanto isso permaneço com as malas arrumadas e tentando agilizar o máximo que ainda está pendente. Preciso finalizar a venda do carro, obter as transferências da Anaterra (Colégio Gentil e Cultura Inglesa), entregar os móveis e eletrodomésticos que foram vendidos no bazar, resolver mudanças e outros assuntos no Banco do Brasil e ainda cuidar da minha saúde.

Este é um assunto que preciso me dedicar mais. São tantos os casos de recidiva, metástase após um câncer de mama que nem quero pensar na hipótese. Quando descobri meu câncer fiquei apavorada, mas ao mesmo tempo segura de que nada aconteceria com meus filhos porque o Manoel estaria ao lado dele. Estava saudável e é um pai completo. Mas a situação se inverteu. Nem tenho tempo de sentir dor, por mais que a mama esquerda lateje, tenha um endurecimento dolorido que às vezes me impede até de deitar de bruços. Preciso correr em busca da minha radioterapia, dos exames de acompanhamento e ficar atenta para, mesmo que surja algo novo e desagradável em meu corpo, eu possa tratá-lo de imediato, sem maiores riscos.

A expectativa é grande. Reencontrar o Manoel será bem doloroso. Ele está debilitado, magro, pálido e quase sem condições de andar. Fica cansado com facilidade e tem pouco apetite. Mas quero ir já ! Preciso ir ! A presença da Dé, a irmã doadora, também vai fazer bem ao seu emocional. Ontem disse a ela que fique em uma redoma, que não adoeça, que cuide-se muito, muito bem. Ela é a pessoa mais preciosa do mundo hoje para nós. Salvará a vida do Manoel !! Uma vitória que não cansamos de comemorar. A compatibilidade com uma pessoa da família e com tanta agilidade vai fazer a diferença no final., Ele receberá a nova medula ainda em condições gerais de saúde boas e dentro de um, dois anos sei que estará de volta à vida normal.

A Anaterra também está ansiosa. Na sua ingenuidade parece até alegre. Vai para São Paulo e como gosta muito de moda, já se imagina combinando peças e cores para curtir o frio. Pelo menos na cabecinha dela o mundo é mais colorido, tem mais rosas do que espinhos. Ao mesmo tempo sente demais a partida. É muito querida entre as colegas e isso agora se comprova com as diversas homenagens que tem recebido das colegas. Festinhas surpresas, cartas e mais cartas ratificando a amizade eterna e pequenos presentes que incluem bichinhos de pelúcia e bijuterias personalizadas. A minha menina está amadurecendo rápido demais.

E enquanto a passagem não vem, tento organizar a casa para receber seus novos moradores. Em breve Rulton, Socorro, Marcela e Leonardo farão companhia à mamãe, Miúcha, Bebel, Timão, Dudinha, Pretinho, Gatinha e Floquinho.

Um novo ciclo que começa... Uma nova janela que se abre

domingo, 15 de junho de 2008

Partida antecipada

O dia ontem foi de sustos e novas decisões. A principal dela foi a antecipação da minha ida e da Anaterra para São Paulo. Viajaremos ainda esta semana, talvez na próxima quarta-feira. A decisão dos médicos em realizar o transplante de medula o mais breve possível e o quadro de saúde com subidas e descidas do Manoel, me levaram a optar por ir na frente. O Raul ficará. Precisa concluir o semestre tranqüilamente, dedicar-se aos estudos e se preparar para o vestibular, mas a Anaterra me acompanhará. É uma grande companhia.Uma ruth Rendeiro em miniatura: fala demais e se mete em tudo, mas é solidária e prestativa.É sempre muito bom tê-la por perto.

O tempo agora ficará mais exíguo ainda. Há muito a decidir: procuração para o meu irmão, antecipação de viagens na agência, elaboração e aplicação dos questionários da monografia para os técnicos do Projeto Bom Manejo, ida ao Colégio Gentil, articulação com o hotel em SP. Tem ainda as bagagens. É preciso definir o que seguirá agora e o que viajará depois com o Raul. Preciso ainda fazer alguns exames que estão pendentes, cancelar a Unimed dos meninos. Ai meu Deus !!parece que a tempestade não passa nunca.

Hoje acordei mais cedo do que o costume. Estou preparando um panelão de mingau de milho para servir àqueles que virão ao bazar daqui a pouco. Espero pelo menos que todo esse trabalho nos traga um reforço financeiro.

A vida nos chama !!!

sábado, 14 de junho de 2008

Recomeçando aos 50

Uma nova aos 50 anos, quando já passamos do meio-dia, como diz um amigo virtual, parece tão difícil. Os temores são muitos, as responsabilidades têm uma dimensão exagerada se comparada com a visão simplista dos jovens que nada temem e em tudo acreditam. Porém, não tenho opção ou melhor: tenho o privilégio de trabalhar há quase 25 anos em uma Empresa que coloca na prática o que muitas utilizam apenas como marketing:”nossos recursos humanos são o nosso maior patrimônio”.Isso tem feito a diferença.

Incontestável a descoberta ingrata e frustrante de que a minha querida Belém não tem condições de tratar doenças mais complexas com dignidade e tecnologia. Lamentável ter que deixar tudo o que construímos em busca de mais alguns anos de vida com qualidade e acompanhamento médico digno. Felizmente, temos encontrado apoio onde já esperávamos, já sabíamos que existia, mas que nem por isso tem deixado de nos surpreender. É como se um batalhão de pessoas estivesse nos protegendo, nos guardando, nos trazendo o que de melhor existe para atenuar esse momento. Dos mais altos escalões, que envolvem pessoas da Sede da Embrapa em Brasília, ao mais humilde colega da Unidade de Belém as manifestações se multiplicam. Não são apenas palavras, mas gestos que incluem doações de novas milhagens para que essa despesa com passagens seja minimizada; informações sobre as Unidades sediadas em São Paulo, a compatibilidade com o meu perfil profissional e as necessidades da Empresa e convites para ir trabalhar em outras Unidades, o que me enche de alegria e aumenta a minha responsabilidade.

Sair de Belém, uma cidade que para muitos que moram no eixo Centro-Sul-Sudeste é quase o fim do mundo, e ser acolhida e reconhecida pelos colegas da Embrapa que estão sediadas no Estado mais rico e desenvolvido do País, é algo que nunca havia pensado em vivenciar. Os que me conhecem sabem o quanto a minha profissão, o meu trabalho representa em minha vida. Trabalho porque preciso, mas acima de tudo porque gosto, porque acredito que posso contribuir, de alguma forma mudar. Sinto-me sim envaidecida, embora tenha explicado aos que me convidaram e têm uma grande expectativa alicerçada no que desenvolvo na Embrapa de Belém há quase 25 anos, que é preciso analisar racionalmente a situação atual e àquela em que me encontrava quando estava no auge da minha produtividade. Durante anos dediquei muitas (a maioria para ser mais exata) horas do meu dia à Embrapa. Não tinha hora pra entrar nem para sair, apenas compromissos a serem cumpridos, metas a serem alcançadas, resultados a serem comemorados. Contudo é preciso analisar os momentos. Hoje não sou a mesma pessoa de dez, cinco anos atrás quando tinha uma infra-estrutura pessoal firme, sólida. Estava na minha terra, ao lado do meu marido saudável, com os filhos, mãe, irmãos, D. Lúcia me dando suporte, permitindo essa doação ao trabalho. Agora é diferente. Estou em outro momento. O cenário se alterou e já não serei a jornalista que fuça, que corre atrás, que briga pelas inserções, que acompanha e prepara os pesquisadores, que atende os colegas de Redação a qualquer hora do dia ou da noite, que escreve e escreve e escreve, que pensa e pensa e pensa.

Meu tempo é outro, meu mundo agora inclui e prioriza hospitais, médicos, exames, remédios e muita insegurança, muito medo.

Minhas necessidades são outras. É óbvio que não cogito parar de trabalhar, me aposentar, deixar de ser produtiva e atualizada e a Embrapa me permite isso, investe e nos dá a chance de estarmos à frente em nossa área, mas quero paz, quero tranqüilidade para me reorganizar, para recomeçar e São Carlos, a cerca de 250 km da capital tem tudo para se tornar o nosso porto seguro. Uma cidade pequena, população em torno de 200 mil habitantes e uma Unidade da Embrapa menor ainda. Enquanto na Embrapa de Belém meu universo incluiu cerca de 140 pesquisadores e mais de 500 empregados, a de Instrumentação Agropecuária em São Carlos reúne 60 profissionais no quadro geral. Serei transferida e novos colegas surgirão em minha vida.

Tudo tende a ser diferente, tudo tende a ser uma nova oportunidade.

O que visualizo é uma rotina de maior dedicação aos filhos, a mim, à saúde, ao marido e ao trabalho. Aos poucos tudo vai se encaixando, fazendo sentido. Ir para Campinas, a segunda opção, não é o que busco, pelo menos agora. É uma cidade grande como Belém com as vantagens e desvantagens de ter mais de um milhão de habitantes. Tentações intermináveis para um rapaz de quase 17 anos e uma pré-adolescente. Violência demais para uma mãe nervosa e frágil que ficará distante dos seus e de tudo o que significa segurança. Bem sei que lá encontraria uma diversidade maior profissional e alguns convites além-Embrapa já tinham sido feitos, possibilidades de uma capacitação mais direcionada às áreas que atuo e tenho mais familiaridade dentro da Comunicação, mas agora não.

Já estou conhecendo São Carlos pela Internet, contatos já foram mantidos e a receptividade tem sido boa demais. Um estímulo que faz a diferença. Uma cidade calma, “a capital da tecnologia” como ressalta o slogan e uma perspectiva de me encontrar e de estar mais perto do que há de mais atual para tratar a minha saúde e a do Manoel.

Tenho muito ainda a resolver, mas a solidariedade dos amigos e familiares tem permitido que a angústia e o cansaço sejam minimizados. O Rulton me ajuda na venda do carro, a Ruthlene leva a Anaterra na escola, a Ieda me telefona e me dá colo, a Vanessa e a Ana Helena me apanham em casa, a Gisele despacha material, a Dóris, incansável, sai de Leme para ficar com o Manoel em São Paulo, a Érika me escreve e me telefona sempre, os vizinhos que não param de perguntar pelo Manoel, o Sílvio Brienza, Jorge Yared e Giorgio me doam suas milhagens, o Xerfan colabora com a liberação de bagagens, pais, professores e freiras do Colégio Gentil se empenham em facilitar nossa vida, assim como a área de pedagogia do colégio Equipe. Tem ainda os dedicados amigos da Faz. Dirigentes, professores e alunos que têm feito tantas homenagens, orações. Tem tanta gente a nossa volta que tenho me perguntado se essa experiência trágica e dolorosa nos foi colocada principalmente para que tivéssemos essa oportunidade de saber que o que plantamos valeu a pena. Essas demonstrações de amizade e carinho, que incluem palavras de incentivo e compreensão do que se passa em nossas cabeças e corações é que me impulsionam a organizar o bazar (badaladíssimo, por sinal !), a me preparar para a partida. Se não fosse esse batalhão que nos acolhe com os sentimentos mais nobres que o homem pode ter, eu estaria agora em São Paulo, sem equilíbrio, sem rumo. Confesso que há horas em que tenho vontade de largar tudo e ir para perto do Manoel, como aconteceu ontem.

Dia 13 de junho será inesquecível nesse nosso sombrio calendário. Depois de analisar a compatibilidade de todos os irmãos, a boa notícia: a Dé (ou Ana Maria), é 100%compatível e no caso de transplante de medula será a doadora. Uma graça, mais esperança, mais uma batalha vencida. Mas ontem também foi um dia difícil. Pela primeira vez, desde que está em SP há mais de um mês, o Manoel passou mal. Cansaço, fraqueza nas pernas, indisposição generalizada e um forte abalo no humor, na esperança. Dormi preocupada e quando o sol ainda nem nascera já estava telefonando, querendo notícias. À noite imaginara comprar uma passagem e amanhã estar em São Paulo. Sim, porque só estou em Belém providenciando com calma e organização nossas vidas porque ele está bem. Felizmente acordou (eu o acordei!) bem disposto e já com outra voz, outra disposição. Tomou plaquetas na madrugada e uma nova medicação lhe deu uma nova arrancada nessa longa trajetória de subidas e descidas que o espera. Que nos espera ....

Sei apenas que quero estar ao lado dele com nossos filhos nos apoiando e com certeza e fé em Deus, recomeçando aos 50.

domingo, 8 de junho de 2008

As primeiras despedidas

A partida é inevitável. Iniciar um outro ciclo imprescindível. Abdicar de muito do que se construiu necessário. Decisão tomada, o momento é de operacionalizar, tentar colocar em prática cada etapa e não se deixar sufocar pelo calendário apertado, pela confusão material e mental.

Malas sendo arrumadas e a difícil opção sobre o que deixar e o que passar à frente. Temos muitas lembranças espalhadas pela casa. Lembranças que marcam passagens significativas de nossas vidas. Eu, principalmente, que sempre gostei de trazer dos lugares por onde já andei algo que o marcasse, guardar como uma relíquia bilhetes, presentinhos com tanta história, retratando momentos e pessoas, agora me vejo obrigada a deixá-los para trás. Temos muitas recordações de amigos queridos que nos presentearam em diferentes momentos de nossas vidas. É preciso reduzir, selecionar, não supervaloriza-los.

A opção prática de como não perder e ainda ganhar foi montar um bazar. O bazar da despedida. Roupas, sapatos, bolsas, eletrodomésticos, móveis e mais um monte de outras coisas serão oferecidas aos amigos a preços quase simbólicos. Precisaremos de dinheiro para nos estabelecer no novo cantinho e paradoxalmente necessitaremos de tão pouco... Muito ficará esperando a nossa volta. Muito jamais teria coração para passar adiante. Móveis de sucupira maciça adquiridos na cooperativa de artesãos de Ponta de Pedras que me acompanham há mais de 20 anos. Uma das minhas primeiras aquisições ainda solteira, quando resolvi fazer a minha vida longe da família. Quadros que não têm grande valor em uma pinacoteca, mas que simbolizam emoções como o que retrata o Círio de Nazaré, presente do Manoel em um dos meus aniversários. Meus CDs originais, caros, queridos. Incontáveis livros e muito artesanato presenteados por pessoas especiais. A parede com dezenas de fotos em preto e branco, muitas com mais de 60 anos, será mantida literalmente. O Rulton, meu irmão, que ficará com o Leonardo, Socorro e Marcela em nossa casa durante essa ausência sem data marcada para voltar, cuidará desse patrimônio pessoal, dessas relíquias de preço inestimável.

Antes da arrumação do que vender, deixar, levar, andei ontem pelas ruas de Belém com o pequeno Leonardo e a Anaterra. Muitos metros, sei lá quantos quilômetros da Conselheiro com a José Bonifácio até o Colégio Gentil, na Magalhães Barata, o túnel de mangueiras amenizado o forte calor. Fui reproduzir o pequeno cartaz, que está aí ao lado, para começar a divulgação do bazar. Criei, sem nenhuma pretensão maior, algo simples e objetivo, que consiga atrair o maior número possível de pessoas a nossa casa, no dia 15 (domingo próximo). Alguns certamente o acharão patético, melancólico, triste, desde o nome. Bazar da Despedida. Mas é de despedida !! Por que buscar eufemismos ? Estou me despedindo de Belém e mais do que isso: me despedindo de tudo o que será colocado à venda.

A cadeira no canto da página que não agradou a colega Vanessa, designer da Embrapa, foi defendida por mim como simbologia da espera paciente pelos futuros acontecimentos, o novo que se apresenta à frente com um horizonte a nos aguardar, o lugar vazio, mas pronto a ser preenchido. Não foi aleatória...

A tarde inteira foi dedicada ao bazar, selecionando, dando preço e arrumando o que será colocado à venda. A Anaterra, como sempre, ao lado, ajudando, participando efetivamente. Dolorido, mas sem pesar, sem sofrimento. Cada peça um adeus. As primeiras despedidas.

Eu, Anaterra e Raul temos imaginado um novo canto, na cidade que ainda não sabemos exatamente qual será, como um espaço pequeno, simples, mas aconchegante. Com muita flor, cores vibrantes, alegres. Algo moderno que contraste com o meu quase museu em Belém. Talvez inconsciente eu queira lhe dar um aspecto de provisório. Comprar e vender pouco, o essencial e rapidamente. Sem apegos maiores, apenas como utilidade. E assim deveria ser. O que permanece em nossa alma são lembranças, são marcas que independem de lugares, são recordações que entranharam em nós. O que está materializado é simbólico, apenas aguça a memória.

Iremos, mas ficaremos ...

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Hora da decisão

Depois de meses e mais meses de indecisão, de idas e voltas, de surpresas, de interrupções, de muita espera e angústia, vejo que chegou a hora da decisão, de olhar pra frente e não medir muito os passos. Precisos, firmes, largos, mas seguros e com uma direção definida.
Os acontecimentos se interpõem e se digladiam; as idéias se confundem e os planos se misturam e se perdem. Preciso, contudo, de um rumo.
O Manoel não pode voltar a Belém. Aqui não há tratamento pra ele. Os nossos últimos governos priorizaram a construção de um belíssimo espaço para eventos (o Hangar), a recuperação do Forte onde foi fundada a cidade ou mesmo um ambiente confortável para as borboletas. A saúde ficou no final da lista e não houve tempo para reformular um cenário caótico há muito tempo. Não há como o Manoel ser tratado nesse caos. Os riscos de complicações estarão sempre presentes e o atendimento, nesses casos, tem que ser rápido. Uma longa conversa pelo telefone finalmente parece ter feito ele cair na realidade, ver o que nos espera nesses próximos anos e acreditar, como tenho acreditado, que estão nos sendo oferecidas as melhores oportunidades e não devemos desperdiçá-las. O tratamento no ACCarmargo tem sido irrepreensível. Hoje ele começa uma nova sessão de quimioterapia. Uma nova etapa, uma nova batalha. A primeira já foi vencida. Fez sete dias ininterruptos da droga forte e quase sem efeitos colaterais e tenho fé em Deus que assim será novamente.
Também preciso me tratar, dar continuidade à radioterapia, em seguida fazer os exames de avaliação e sei que aqui também não é o melhor lugar. Felizmente a clínica de Campinas me aceitou de volta. Enviei uma mensagem objetiva e emotiva para o médico responsável pela radioterapia e recebi a resposta ontem à noite. Poucas linhas, mas o suficiente para eu chorar de alegria: “Ruth, não se preocupe. Venha assim que puder e reprogramarei o seu tratamento”. Ainda bem que o médico do Ophir Loyola estava enganado ou quem sabe o universo limitado dele o tenha feito a acreditar que uma clínica tão renomada não me aceitaria de volta. Achou que agiriam como certamente eles agem aqui. Que bom que errou ...
Com tranqüilidade que uma decisão dessa permite, com seriedade e sobretudo pedindo sempre a Deus e a Nossa Senhora de Nazaré que me mostrem os caminhos menos pedregosos e mais iluminados, decidi deixar Belém de mala e cuia e como dizemos por aqui.
Ouvi pessoas lúcidas, amigas, aquelas que de fato desejam o meu bem, que nutrem por mim e pela minha família um carinho verdadeiro e todas foram unânimes em me aconselhar a partir.
Decisão tomada, agora é a hora de operacionalizar o mundo novo que se apresenta a mim. O excesso de responsabilidade está me sufocando. São muitas ações para tão pouco tempo e em áreas que não transito com muita intimidade como venda de carro, de eletrodomésticos, proposta de empresas de mudança. Esses são temas que eram do domínio do Manoel. De repente me vejo indo à oficina, providenciando bateria nova ou buscando a liquidação antecipada da dívida junto ao banco.
Já fui ao colégio dos meninos. Conversei com as orientadoras educacionais e saí de lá de novo com a certeza de que estamos tomando a decisão mais acertada. Sempre fomos pais presentes, embora nem sempre o tempo ajudasse. Mas na medida do possível estávamos lá: participando, indo às reuniões e eventos, conversando com os professores e diretores, sabendo sobre os colegas deles. Enfim, tentando conhecer mais de perto esse mundo que está além dos muros protetores de nossa casa. Isso facilitou muito o contato e a notícia do adeus. Lamentos sim, mas votos de boa sorte também.
Para o Raul parece ser um pouco mais difícil. Tem sua turma de anos, amigos que o acompanham há dez anos. Amizade que extrapolou a eles e que uniu nossas famílias. Tem ainda o fato de ele estar cursando o terceiro ano do ensino médio, cabeça voltada para o vestibular. Um vestibular que até uns dias atrás limitava-se a Belém e que agora se abre em sua frente. Está perturbado, mas me parece que ao mesmo tempo feliz com o novo desafio (maior, é bem verdade) e com a perspectiva de poder cursar o que não existe ainda por aqui. Uma janela com um belo sol acaba de lhe ser presenteada. A Anaterra é mais festiva. Quer saber se tem shopping, se poderá continuar suas aulas de dança. O MSN diminuirá essa distância e Belém não ficará tão longe assim. Algumas horas de vôo e de novo estaremos aqui tomando tacacá, açaí, pegando chuva, comprando peixe no Ver-o-Peso ou comendo camarão em Mosqueiro.
Não tenho medo da mudança. Acredito mesmo que isso estava reservado a nós. Nossos filhos merecem ter a oportunidade que nós não tivemos. Se eu consegui ser uma jornalista e o Manoel um engenheiro civil foi por insistência, por intuição, sorte. Eles, como todos dessa geração, têm consciência que precisam ir muito além. A graduação é só um início, uma fase básica. O mestrado e o doutorado os espera. Assim pensamos, assim planejamos, assim desejamos. Se não acontecer não será por falta de determinação, dedicação e agora oportunidade.
Ainda não sabemos exatamente qual a cidade que nos acolherá, aquela que se tornará nosso lar pelos próximos anos. Dependo da Embrapa. Irei para onde necessitam de mim. Sou um soldado da Empresa. Mas também não temo esse aspecto. Vejo como uma nova experiência. Vou ser testada profissionalmente aos 51 anos. Uma idade em que muitos estão se aposentando, pensando em parar, sentido-se ultrapassados profissionalmente. Terei que estudar muito, conhecer a realidade de um outro lugar, bem diferente da minha Amazônia. Certamente não escreverei mais sobre búfalos, floresta amazônica ou bacuri, mas vou me empenhar para aprender de novo e renascer.
Sei que ainda vou chorar muito de saudade antes de ir e quando estiver longe. Saudade de tudo e de todos. Dos vizinhos que mais do que nunca têm sido grandes amigos; dos amigos que não verei o rosto com tanta freqüência; dos parentes que ficarei sem abraçar; das ruas que conheço desde criança; da nossa comida; do calor abafado e de tudo que só o tempo me mostrará.
Será difícil partir, mas sei que este é o ÚNICO caminho. Quero viver mais, quero que o Manoel veja nossos meninos crescidos. Precisamos ainda deles e eles de nós e se isso depender de mim, assim será feito.
Gosto desse sabor de desafio, de novidade, de buscas. Vou atrás do que me pertence, vou brigar pela minha saúde, vou em busca de novos horizontes. Só preciso saber exatamente para onde.
Logo logo saberei ...