Quem sou eu

Belém/Ribeirão Preto, Brazil
Amazônida jornalista, belemense papa-xibé. Mãe, filha, amiga... Que escreve sobre tudo e todos há décadas. Com lid ou sem lid e que insiste em aprender mais e mais... infinitamente... Até a morte

Aos que me visitam

Sintam-se em casa. Sentem no sofá, no chão ou nessa cadeira aí. Ouçam a música que quiser, comam o que tiver e bebam o que puderem.
Entrem...
Isso aqui está se transformando em um pedaço de mim que divido com cada um de vocês.
Antes de sair me dê um abraço, um afago e me permita um beijo.

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domingo, 20 de julho de 2008

Uma casa de faz-de-conta

Não é uma casa, mas um hotel. Não escolhi os móveis. São todos padronizados. Não tem uma foto na parede ou um porta-retrato. Nem um vasinho com flores ou mesmo uma cortina florida. Mas está sendo nosso lar nesses dias. Um quarto comprido com quatro camas (usamos três), um pequeno sofá-cama, um pequeno banheiro e uma mínima cozinha com um fogão sem forno, um frigobar e um minúsculo armário. As meias, cuecas, calcinhas e até blusas estão sendo lavadas na pia do banheiro, mas tenho tentado ver esse espaço impessoal como se neste momento fosse o mais belo de todos os lares. Estamos juntos, próximos ao Manoel. Tenho cozinhado para nós (bife de carne bovina ou filé de frango), arroz integral, salada (eu e a Anaterra comemos bem), ovos cozidos, miojo, atum, salsichas de peru e uma farofa comprada pronta têm sido nossas refeições (não tudo de uma vez, é claro) complementada com sucos, leite, cereais e muitas frutas. Aos poucos vamos tendo uma rotina. Nessas últimas noites o Raul tem dormido no hospital. Dormido não, cochilado ao lado do pai. Mais uma experiência para o enorme rol que tem marcado a vida ainda tão curta do meu filho. É calmo, sereno e otimista. Uma folga necessária ao Pedro, o irmão que tem estado ao lado do Manoel desde que veio de Belém.
Nem mesmo diante de um quadro tão preocupante como ontem, o Raul se abalou. Viu o pai passando mal, ofegante, indisposto, quase sem falar, irritado, nervoso e chorando por qualquer motivo. Nem conseguiu falar com a tia Jorgete que estava em nossa casa abraçando a mamãe pela passagem dos seus 73 anos. Ontem eu vi a morte rondando o quarto 430. Cheguei a pedir que fosse dado um calmante para ele e assim pudesse dormir mais tranqüilamente. Deixei o hospital muito mal, sentindo muito medo de no dia seguinte encontrá-lo pior. Um quarto enorme esperaca eu e a Anaterra. Só nós duas. Sozinhas. Eu mais ainda em meus pensamentos, em meus temores sem ter com quem dividir. Este tem sido um dos maiores desafios. Calar, chorar em silêncio na madrugada, temer e não extravasar. Embora os meninos saibam de tudo, não quero que sofram na mesma proporção que eu. Tenho mais referenciais para comparar, mais informações para visualizar o que não é tão bom. Meus medos são maduros, vivenciados por alguém. O espelho dos 51 anos que me mostra um mundo de muita dor, de falência lenta e gradual, de morte sem acidente, sem gritos, silenciosa, calma.
Sei que não estamos sós. As demonstrações de solidariedade, amizade, carinho, generosidade têm vindo de tantos lugares, de tantas pessoas diferentes. Dos antigos e velhos amigos como os jornalistas que acompanham a minha vida desde muito jovem e os da Embrapa de Belém que nos conhecem há tantos anos, aos vizinhos carinhosos de Canudos que telefonam, que mandam mensagens aos ex-alunos e amigos virtuais (alguns nem tão virtuais assim). Rulton e Ruthlene têm sido incansáveis. Além de estarem cuidando do nosso pequeno, mas valoroso patrimônio que incluiu nos cachorros e gatos, têm se desdobrado pra vender a rifa do notebook e assim minimizar as despesas que não param nunca. Tinha tudo organizado, inclusive as finanças. Fiz tudo muito bem planejado, bem pensado, mas não imaginava que necessitaria ficar tanto tempo em São Paulo. Não cogitei que o Manoel fosse ficar tão debilitado clínica e emocionalmente e que a nossa presença fosse ser vital para ele nesse momento. Despesas com hotel, passagens e alimentação que fugiram do controle e aí entram os amigos, os parentes. As cunhadas Socorro e Dóris têm demonstrado que além dos irmãos, também nos amam muito. A doce Thaís que chama o Manoel de “nosso pai”, tanta gente que seria injusto citar mais algum e certamente cometer erros.
Tem ainda a mamãe, uma tímida e silenciosa guerreira que novamente quer estar ao nosso lado para nos ajudar. Temos sido, nos últimos 16 anos, sua família mais próxima. Está ao lado do Raul desde que ele tinha 1 ano, viu a Anaterra nascer e elegeu o Manoel seu quinto filho. Chora e sofre por ele e por nós. Sabe o quanto é fundamental para nosso equilíbrio. Tê-la ao nosso lado significará um porto seguro que retorna, é a certeza de que poderei chorar no ombro de alguém, comer um bole fofinho e tomar um café de coador. Por isso estamos fazendo tudo para que ela venha o mais breve possível. Se Deus quiser, na próxima semana o Rulton a trará pra junto de nós. Um alívio para todos.
Assim tenho conseguido seguir em frente, pensando sempre nos dias que virão. Neste momento o que mais me incomoda é ter que ficar tanto tempo nesse ambiente de hospital e o com um agravante: um hospital especializado em câncer. Aqui encontro pessoas amputadas, sem mama; cabeças sem cabelos; pele amarelada e corpo esquálido. Tudo o que não quero que aconteça comigo. Um lugar onde a morte é a presença mais freqüente. Hoje algo de grave aconteceu no quarto ao lado. Muita gente, muitos abraços, muitas lágrimas. Não quero ver isso, não quero imaginar que posso viver essas cenas como protagonista.
Daqui a pouco retornarei ao hotel. Mais uma noite. Felizmente hoje o Manoel está mais disposto, menos emotivo, mais confiante e essa confiança nos contagia. Sorri, participa das conversas, interage com o que vê na TV, conversa com os filhos e se interessa pelo que escrevo, pelas mensagens que recebo na Net. Atender ao telefone e conversar com os amigos que o procuram, é sinal de vida, é a certeza de que quer viver, que a vida lateja e pede passagem.

2 comentários:

Anônimo disse...

O JUSTO CONFIA EM DEUS

Você que habita ao amparo do altíssimo, e vive à sombra do Onipotente, diga a Javé: "Meu refúgio, minha fortaleza, meu Deus, eu confio em ti!"
"Eu o livrarei, porque a mim se apegou.
Eu o protegerei, pois conhece o meu nome.
Ele me invocará, e eu responderei.
Na angústia estarei com ele.
Eu o livrerei e glorificarei.
Vou saciá-lo de longos dias e lhe farei ver a minha salvação".
Sl 91,1-2-14-15-16

Muita fé e força neste momento de sua vida, que Deus abençoe vocês.

Joelma- João Pessoa-PB

Anônimo disse...

Ruth, deixa que MANOEL ESCOLHA POR SI SÓ O QUE QUER FAZER, INDEPENDENTEMENTE DE SEU BLOG, DE SEUS AMIGOS, DE SUA FORÇA, DEIXA QUE ELE RESPIRE E RELAXE, JUNO0 A VC E AOS FILHOS É CERTO, MAS SEM A MENOR PRESSÃO QUE TUDO ISSO SIGNIFICA: A OBRIGAÇÃO DE ESTAR BEM.
pENSE nisso e tente deixar o Manoel um pouquinho masi à vontade.