A minha claustrofobia é antiga. Não faz muito tempo que todos conheciam meu pânico de avião; meu medo de elevador e as sensações horrorosas que tomavam conta de mim quando me sentia presa. Podia ser um quarto fechado com uma grade na janela ou simplesmente um banheiro que insinuava que não iria abrir. Terapia, remédios e uma boa dose de persistência reduziram drasticamente essas manifestações que ainda eram motivo de chacota, afinal, uma jornalista que não entra em um elevador ? ahh não acredito !
Mas quando saímos de Londres para ir a Paris não percebi de que forma se daria essa locomoção e nem procurei saber. Estava entregue nas mãos dos guias, da agência que contratei. Avião, barco, trem, ônibus, van... qualquer coisa não faria diferença. Mas só chegando às proximidades do que é conhecido como Eurotunel soube exatamente como ia mudar de um país pra outro.
Lembra, muito mal, é verdade, as travessias de nossos rios amazônicos. Grandes balsas, mas ao contrário de céu aberto, onde podemos ir apreciando o vôo dos pássaros, os peixes em volta da gente, a paisagem exuberante, os ribeirinhos passando em suas minúsculas canoas, o que fui sentindo foi o ar faltando e a escuridão dominando o ambiente. O ônibus estava entrando em uma espécie de container que parecia ter sido feito exatamente para as suas exatas medidas. Nem um metro a mais de um lado e nem do outro. Um leve balanço, que não lembra maresia, mas um grande amortecedor me deixou um pouco tonta.
Vários avisos em forma de cartazes e outros pelo som em inglês e francês, deixavam mais evidente que aquilo era perigoso. Tinha até túnel de emergência!! Comecei a ler o panfleto explicativo e quase morro: durante 39km nós estaríamos a 40m abaixo do mar do canal da mancha. Nem liguei mais para o que estava ainda no papel. Primeiro amedrontam depois tentam nos convencer o quanto a obra é importante para a engenharia mundial. É o maior metrô marítimo do mundo ou a obra de engenharia mais ambiciosa e cara da sua época. Lia, mas não parava de pensar que acima da minha cabeça estava o mar. É claro que tentei disfarçar, fingir que tudo me parecia normal, que já fizera aquela travessia pelo menos uma dezena de vezes. Só o coração acelerado, felizmente imperceptível para os que estavam do meu lado, denunciavam o mal estar. Isso pra ser generosa comigo mesmo.
Bastava, porém, alguém um pouco mais observador pra perceber o meu grande alívio quando o container se abriu e saímos daquela lata de sardinha. Eu estava vendo o sol, tudo bem que ele estava encoberto pelas nuvens e neblina. O dia estava cinza, mas nunca me pareceu tão lindo !
Depois de percorrermos alguns quilômetros um presente não anunciado: uma parada de cerca de três horas na belíssima cidade de Bruges, na Bélgica. Um cenário de filme... E pra comemorar a vida pós Eurotunel e experimentar o novo, resolvi encarar uma das centenas de cervejas que os belgas tanto apreciam. Pedi a mais forte, uma garrafa de apenas 330ml acompanhado de croquete madame (um sanduíche com um ovo frito encima. O croquete monsieur não tem ovo. Por que ? Não sei) . 8,5 % de álcool e como já passava do meio-dia, tinha comido pouco, no terceiro gole pensei que ia cair da cadeira. Felizmente o almoço chegou, degustei o restante da estranha cerveja e aproveitei pra dormir até Paris.