Quem sou eu

Belém/Ribeirão Preto, Brazil
Amazônida jornalista, belemense papa-xibé. Mãe, filha, amiga... Que escreve sobre tudo e todos há décadas. Com lid ou sem lid e que insiste em aprender mais e mais... infinitamente... Até a morte

Aos que me visitam

Sintam-se em casa. Sentem no sofá, no chão ou nessa cadeira aí. Ouçam a música que quiser, comam o que tiver e bebam o que puderem.
Entrem...
Isso aqui está se transformando em um pedaço de mim que divido com cada um de vocês.
Antes de sair me dê um abraço, um afago e me permita um beijo.

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sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Viúva eu ?!!

A tomada de consciência de que meu mundo mudou parece mais assustador do que quando eu estava no olho do furacão. Aos poucos vou me reconhecendo como uma mulher só, uma viúva. Não uma viúva do início do século passado, de roupas pretas que encobriam todo o corpo, mas nem por isso ausente de luto. A vida está se mostrando como uma paisagem turva em que minha visão pouco consegue vislumbrar. Não distingo o vermelho do roxo; o azul do preto. Uma névoa recobre meu futuro.
A certeza da ausência incomoda demais e bate à porta a cada lembrança, a cada necessidade da presença. Não tenho mais a pessoa que me entendia com um simples olhar, com quem brigava sem limites e no final dizia “quando você estiver mais calma a gente volta a conversar”, o homem que quase enlouqueceu quando descobrimos meu câncer, mas que ironicamente a vida dele é que corria perigo. Bem mais perigo. Era ele que está sendo dizimado por essas células infames, aterrorizantes, traiçoeiras.
Não tenho mais a presença daquele companheiro para conversar sobre os filhos antes de dormir, para ligar no meio da manhã ou da tarde desesperada com a demora inexplicável ou apenas para comentar as novidades, as conquistas de cada um. Sinto falta até do homem-faz-tudo que pendurava os quadros na parede ou me acompanhava ao supermercado. Que ia comigo ao médico ou ao mercado do Ver-o-Peso quase todos os sábados em busca de peixe fresco e frutas regionais.
A fragilidade da vida me enfraquece. Tenho buscado, em tudo o que vislumbro como uma saída para arejar a cabeça, concentrar-me mais e mais e não ficar editando lembranças desconexas ou tão nítidas e recentes.Ou outras recordações mais remotas que vão lá atrás, nos nossos primeiros contatos embrapianos ou as que marcaram a nossa despedida no hospital, ele já inconsciente. Imagens que se confundem, se entrelaçam, que vão e voltam e me torturam.
Sei que tenho que me reerguer. Sinto-me cansada, estressada, aborrecendo-me por pouca coisa com os meninos e justamente com eles que também estão sofrendo com essa partida. Tento imaginar a cabeça de cada um, os sentimentos desconhecidos que dominam seus corações diante de um carro antigo que passa na rua ou de um grito mais descontrolado que emito, mesmo que me arrependa depois. A figura paterna tão presente não existe mais e desapareceu tão rapidamente que ainda não conseguimos digerir essa partida. Sei que nunca poderei substituí-lo por mais que tente. O Manoel não foi um pai qualquer. Não era aquele pai ausente, autoritário ou que simplesmente vem pra casa dormir. Não ... talvez fosse o pai que todo filho sonhara. Tento convencê-los que o importante é que eles tiveram esse pai, mesmo que tenha ido tão cedo, mas o privilégio da convivência é que tem que ser comemorado. Tantos gostariam de tê-lo por um, dois anos, eles tiveram por mais de dez ! Mas será que eu acredito nisso ?
Amo demais meus filhos, mas sei também que eles são o meu pára-choque, é com eles que eu surto, é com eles que extravaso o que nos outros ambientes eu consigo reprimir, manter a calma aparente. Mas nesse momento tão delicado para todos nós, não posso agir dessa forma. Preciso de um tempo longe deles, sair desse ambiente fúnebre, onde possa ver a vida e brindar a ela, voltar a acreditar que poderei viver novamente, sorrir, gargalhar. A possibilidade de ir para Brasília ainda este mês e rever amigos queridos, aprofundar meu conhecimento sobre a Embrapa tem enchido meus dias, me dado-me um sopro de novo, de prazer. É apenas uma possibilidade, mas que tem me servido de companhia antes de dormir. Cinco dias em contato com o mundo que deixei lá fora há quase um ano quando o carcinoma ductual invasivo foi constato em minha mama e que se prolongou com a enfermidade do Manoel, que detonou com a morte dele. Um mundo que sempre me atraiu: de novidades, superações, inovações, competição saudável (ou às vezes nem tanto!), criatividade, ousadia. Tudo farei para ir a Brasília. Uma despesa não prevista, mas que trará melhor resultado do que consultas com psiquiatra e várias doses de remédios tarja preta. Voltarei mais leve, menos tensa, mais saudosa dos meninos, mais feliz por ver a felicidade dos (nos) outros. Na capital federal, além de pessoas queridas que a Embrapa me deu de presente como a Marita, Beth, Robinson, Rosângela, Ana Laura que estão em Brasília, tenho ainda “irmãos” como a Renata e Carlos Honorato. Uma boa oportunidade para ser acarinhada, paparicada e de alguma forma sentir que ainda estou viva, mesmo com a alma tão ferida. Preciso de abraços sinceros.
Mas antes preciso retornar ao médico, avaliar algumas manifestações em meu corpo que têm me preocupado, me assustado demais. Depois da descoberta do câncer, tudo parece que se relaciona a ele. Não teremos mais uma gripe, mas câncer na garganta; não há mais infecção intestinal, mas tumores no estômago ou esôfago e eu não sou diferente. Entro em paranóia e sofro por antecipação ao imaginar o retorno das células se multiplicando desordenadamente, que retornaram agora com muita força. Depois de seis meses sem menstruar, ao começar o tamoxifeno que ficarei depende durante cinco anos, de repente começo a sangrar com muitas cólicas e forte indisposição. Sinto-me inchada e temo uma rejeição ao remédio o que poderá ter a indicação de retirada dos ovários e útero com prevenção de câncer nesses órgãos já que meu tumor é receptivo a hormônios, se alimenta deles. Felizmente já tenho consulta marcada para a próxima segunda-feira em Campinas com o mastologista e ele decidirá qual o melhor procedimento, enquanto isso, além da força interna para não sofrer mais do que o necessário, tentando entender cada etapa do luto, preciso agora de uma dose extra de força física também.
Será que eu agüento ?

5 comentários:

Unknown disse...

Claro que sim vc aguenta! Vc só precisa se cuidar, está atenta como vc sempre foi, viajar (hum que legal)neste momento lembrei da sua história no Fantástico kkk sobre seu medo de viajar de avião...(será que eles colocaram no site da Globo?)Os filhos, eles te entendem sim. É claro que vc não é perfeita, ninguém o é, é normal as oscilações. Lembre-se não estamos aqui a toa, mas seguiremos confiante. Vá ao médico o quanto antes para avaliação.
TENHA UMA SEMANA DE REFAZIMENTOS E TRANQUILIDADE. bjs pra vc e Raul & Anaterra

Anônimo disse...

Oi, Ruth! Recebas o meu abraço e a torcida para que teus planos dêem certo. Não percas a coragem de avançar, nunca retroceder.
Doralice Araújo, uma parauara em Curitiba.

Anônimo disse...

ei moça,
tua história é única e é isso que te faz especial.força, força, por ti, pelos teus filhos, pela tua história que nunca foi de derrota.teu mahuel tá te protegendo de longe.acredita nele.

Gabbay disse...

AGUENTA!!!

Tô te acompanhando sempre por aqui, por essa rede digital. Penso sempre em vocês. Abração,

Anônimo disse...

Ruth, tenha muita força...sei que você é capaz e estamos torcendo por você...saudades... beijos a Anaterra e Raul
Marta Abe