Quem sou eu

Belém/Ribeirão Preto, Brazil
Amazônida jornalista, belemense papa-xibé. Mãe, filha, amiga... Que escreve sobre tudo e todos há décadas. Com lid ou sem lid e que insiste em aprender mais e mais... infinitamente... Até a morte

Aos que me visitam

Sintam-se em casa. Sentem no sofá, no chão ou nessa cadeira aí. Ouçam a música que quiser, comam o que tiver e bebam o que puderem.
Entrem...
Isso aqui está se transformando em um pedaço de mim que divido com cada um de vocês.
Antes de sair me dê um abraço, um afago e me permita um beijo.

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terça-feira, 26 de agosto de 2008

Sentimentos contraditórios

Ainda estou cheia de dúvidas. E das mais diversas possíveis e o que é pior: hoje tenho poucas pessoas para dividir tanta angústia e insegurança. Não que as pessoas em São Carlos não estejam dispostas a me ouvir. Tenho esbarrado em algumas especiais, mas não entenderão o que passo, não acompanharam meu passado, ainda não fazem parte da minha história. Apenas ouvirão, comentarão superficialmente, mas não mergulharão nas minhas emoções e talvez nem compreendam os reais motivos desses sentimentos contraditórios que me perseguem noite e dia.
Os dias mais recentes têm me reservado oportunidades únicas para pensar, avaliar e pesar o que pretendo daqui pra frente, como imagino meu futuro. Minha prioridade neste momento são meus filhos. A partida do Manoel aumentou a minha responsabilidade. Já não tenho com quem conversar sobre eles usando o verbo na primeira pessoa do plural. Agora eles são “meus” filhos. Uma decisão mais difícil, uma ponderação ou uma repreensão mais firme será única e exclusivamente tomada e assumida por mim. Nem tenho com quem comentar que percebi isso ou aquilo, que estou preocupada com esta frase ou feliz com a descoberta de que eles são mais maduros do que imaginávamos.
Preciso ser doce, afável, carinhosa, amiga, mãe devotada e presente, mas ao mesmo tempo rígida, segura, cobradora, incentivadora e observadora em uma cidade onde não conheço quase ninguém, onde as ruas ainda são uma incógnita e me levam a caminhos tortuosos, onde as pessoas começam a ser desvendadas e os novos amigos deles, que estão entrando devagar na vida de cada um, despertam em mim, na mesma proporção, boas e más sensações, medos e alegria, tranqüilidade e perplexidade.
Minhas perguntas estão quase todas sem respostas. Nem minha terapeuta, de tantos anos, está aqui. Sinto falta dela. Alguém que, mesmo já tendo ultrapassado a relação paciente-profissional, ainda é a que consegue captar com lucidez que me sinto fragilizada diante deste novo mundo, mesmo que aparentemente esteja forte, sorridente, tentando cuidar de mim mais do que nunca, freqüentando academia, controlando a alimentação, indo ao cabeleireiro com regularidade, mantendo-me cheia de planos. Sinto falta da hora semanal em que podia ouvir e ser ouvida e ao final ter algumas frases para refletir e assim entender melhor minhas emoções, ações e reações. Poderia procurar outro profissional em São Carlos, certamente há excelentes, mas de novo sentirei falta do passado, do fazer parte da minha história. Ele, assim como a maioria das pessoas que tomam conhecimento do que tem acontecido com nossas vidas nesse passado recente, certamente ficará impressionado e ao final dirá que estamos no caminho certo, que sou lúcida, forte e coerente. Não sou !!! Tenho tantas dúvidas...
Misturo a certeza de que aqui é o melhor para o Raul e Anaterra e a saudade de Belém; a leveza de estar em uma cidade limpa, segura, tranqüila com a vontade de rever lugares, reencontrar meu povo, minhas origens; a vontade de experimentar o novo com o enorme vazio que o velho me dá; a experiência de estar “perto” do mundo podendo sair para qualquer lugar sem problema e a custos menores com a ausência dos amigos, com as ruas conhecidas e rostos familiares. Sinto-me em uma encruzilhada.
A efemeridade da vida me assusta. Ao mesmo tempo em que tenho vontade de viver intensamente, de sair em busca de tudo aquilo que eu acredito ser a felicidade, pergunto-me se não estou sendo irresponsável. Ela pode estar aqui, enquanto vejo meus filhos crescerem e de forma surpreendentemente amadurecida entendendo o que se passa, freando seus impulsos, buscando uma compreensão que poucos, nessa idade, demonstram. Ou muito distante, bem mais longe do que a marioria imagina. Quando saber ? Como agir ?
Quanto tempo viverei ainda ? Nem eu nem ninguém nunca saberemos ! Mas saber que posso produzir células cancerígenas, que periodicamente serei submetida a uma bateria de exames que caçarão novos cânceres e que existe a probabilidade de um novo surgir, aumenta ainda mais o gosto ruim de que tudo é passageiro, que o amanhã não nos pertence, que não podemos ir além do que está predestinado a nós.
Tento tirar o máximo de proveito dessa experiência com a partida do Manoel. Analiso tudo com enfoques diferentes, busco explicações que me permitam compreender como é possível acabar tudo tão rapidamente. Na próxima sexta-feira, eu e Raul iremos a São Paulo e entre as atribuições está retirar as cinzas do crematório da Vila Alpina.
Desde já estou angustiada. De novo se manifesta a patologia há tanto diagnosticada: ansiedade antecipatória. Vou receber, em uma caixinha, o que antes era uma pessoa que passou 18 anos dividindo a mesma cama comigo, que me deu dois filhos maravilhosos, que está na minha história para sempre. Como é possível ser tão efêmero ? Há quatro meses o Manoel estava ao nosso lado, fazendo planos para assumir a coordenação de obras na Embrapa, um sonho antigo que começava a se realizar: enfim atuar como engenheiro. Participando da vida dos filhos, se orgulhando do desempenho do Raul no colégio, com a transformação da Anaterra em uma mulher, visível no corpo, mas ainda ausente na cabeça infantil. Este homem que deixou tantos amigos, que causou comoção em Belém com a sua morte, que tem desencadeado incontáveis manifestações agora nos será devolvido como um pó.
Não consigo entender !! Não consigo aceitar !
Talvez essa proximidade com o momento que eu queria tanto adiar esteja me deixando tão reflexiva, tão abalda, tão carente de pessoas que me conhecem bem, que entenderiam essa necessidade de ir atrás de um sonho, de buscar momentos intensos que de fato me dêem a certeza de que vale a pena viver, que estou viva, independente de quanto tempo.
Constatar que o mundo não sofre quaisquer mudanças com a sua morte, que mesmo os filhos, esposa, amigos, familiares prosseguem suas caminhadas também me perturba. O dia amanhecerá sempre, independente de você estar vivo ou morto . A ausência aos poucos se tornará uma doce lembrança como se em um sonho tivéssemos construindo uma casa com a nossa cara, discutido sobre tantas coisas insignificantes ou não, idealizado o futuro de nossos filhos preocupados em lhes oferecer mais do que a vida nos deu.
Estou tão confusa ...

6 comentários:

Anônimo disse...

Olá,Ruth!
Fiz uma leitura vertical das tuas palavras e quero que ao lado da tua coragem também encontres a companhia desta parauara em Curitiba. A virtualidade pode ser uma possibilidade generosa, sabias? Já inclui a tua página entre as minhas favoritas e virei aqui todos os dias para te desejar SAÚDE - e acompanhar os teus progressos.
Recebas ai um grande abraço da Doralice Araújo

Anônimo disse...

Oi, queria poder ajudar de alguma forma mas é muito difícil, só você sabe o que sente, vou tentar escrever algumas palavras que pelo menos te faça se sentir melhor. Não te conheço pessoalmente mas sinto um carinho enorme por você e gostaria de ter feito parte da tua história.
Viva intensamente cada momento presente sem se preocupar com o amanhã que só a Deus pertence, ELE é o Senhor da vida e sabe tudo, em momento algum nos deixará sozinhos, é nosso escudo, nosso protetor, entrega tua vida, teus filhos e segue enfrente, não desanimes pois o Senhor está contigo nesta caminhada que só Ele sabe onde vai chegar, fica com Deus, um grande abraço pra vocês.
Joelma

Anônimo disse...

Olá, Ruth! Como estás? Deixo um abraço bem apertado, da conterrânea e leitora, Doralice Araújo.

Valdir Macenco disse...

Olá, sou amigo da Doralice Araújo, virtualmente, a muito tempo, li seus comentários, já passei por perdas também, só o tempo ameniza essa dor, mas o amor continua sempre, as boas lembranças. Tenho minha mãe que criou a 3 filhos após a partida de meu pai, que sofreu com um câncer incurável, ela lutou e luta muito, nos educou bem, vivo perto, tenho minha família, mas não deixo de visita-la sempre, meus sogros também lutaram muito, hoje sofrem com uma série de abalos na saúde, mas não desistem, lutam, a fé em DEUS é muito grande, aflora, é bonito de ver, mesmo sofrendo dores quando estavam doentes e em hospitais, nunca deixaram de sorrir, poís sabiam que a família e amigos estavam por perto, mas a alegria de ter DEUS dentro do coração que os fez vencer e hoje estão muito bem, se cuidam. Nunca fiquei longe de minha cidade natal, então não sei o que é sentir saudades tão marcantes, mas com certeza você irá encontrar pessoas que lhe ajudarão, e tenha fé, poís sem fé não podemos viver. Deus lhe abençõe e sempre que possível virei aqui dar um Oi, um Olá..Valdir Macenco, um amigo virtual.

Webeatriz disse...

Querida Ruth, leio teus escritos e absorvo lições. No fundo os que vem aqui te ler , são os ouvidos que queres ter.
O dificil e responder em palavras escritas, nesta caixinha de comentário. Mas podes ter certeza que continuas em nossos pensamentos e preces.

Ainda ontem no salão li uma entrevista com o Vice-presidente , ele que vem lutando com recidivas de cãnceres, disse algo assim, a "hora" chega para todos, Deus não precisa de um cãncer para me levar.

Sobre a distãncia Belém-São Carlos. Pensa que estas ai temporariamente, pela tua saúde, muito mais que pela oportunidade de "vida melhor" para "os meninos", porque talvez agora nesse estágio da vida , o melhor para eles é a convivência com os familiares e amigos de Belém.

Eu, degredada filha do Amapá, mesmo depois de 20 anos aqui, tenho sempre a sensação de que devo isso aos meus filhos, sobretudo quando estamos , diante de um bolo de aniversário, num "parabéns pra vc." solitário a quatro.

Bjs

Anônimo disse...

Olá Ruth, estou aqui pra te deixar meu abraço fraterno, e te dizer que são normais suas dúvidas, não é fácil as mudanças que estão ocorrendo, procure fazer o que seu coração e razão intuem. Procure o terapeuta se vc achar que precisa sim, porém não esqueça o melhor terapeuta é aquele lá de cima, nosso Pai Celestial, peça a Ele sempre a ajuda necessária, uma idéia, resposta de tudo que vc achar que tem dúvida, e Ele te ajudará com certeza.
Permita-se chorar (quando e como quizer) permita-se sonhar, permita-se ouvir o silêncio ou canto dos passarinhos, permita-se!, vc ainda está aqui, ainda precisa conduzir/orientar Raul e Anaterra,e não se preocupe eles te entendem amiga.
Forte vc é sim, é que sempre acharmos que não, mas somos. Vc é uma pessoa boa e foi e ainda é muito auxiliada, através de pensamentos, preces, isso é importante.
A dúvida, a mistura de sentimentos de que ai é o melhor para o Raul e Anaterra e a saudade de Belém também é natural...fica tranqüila e calma. Mães tem um sexto sentido que só Deus pode explicar. E quando vc acha que não é mais bom ficar em São Carlos, mude, volte, enfim..
Cuide-se, faça tudo o que for necessário para sua saúde, trabalhe, crie, viva, porque Deus está sempre do teu lado.
Espero que o dia 29 tenha sido bem. Lembre-se as cinzas foram o “vaso” que Manoel usou. Ele está em outro plano espiritual bem melhor com certeza. E um dia vcs se encontraram.... quando? só Deus o sabe.
Não fique confusa!
Deixo meu abraço e um bj no seu coração.
Jesus Cruz