Quem sou eu

Belém/Ribeirão Preto, Brazil
Amazônida jornalista, belemense papa-xibé. Mãe, filha, amiga... Que escreve sobre tudo e todos há décadas. Com lid ou sem lid e que insiste em aprender mais e mais... infinitamente... Até a morte

Aos que me visitam

Sintam-se em casa. Sentem no sofá, no chão ou nessa cadeira aí. Ouçam a música que quiser, comam o que tiver e bebam o que puderem.
Entrem...
Isso aqui está se transformando em um pedaço de mim que divido com cada um de vocês.
Antes de sair me dê um abraço, um afago e me permita um beijo.

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segunda-feira, 2 de maio de 2011

MERGULHANDO NAS PALAVRAS

As aulas aos finais de semana em Sp (a cada 15 dias) continuam intensas. O curso tem se mostrado compatível com o que busco. Cansativo, mas com aulas que nos levam a produções que fogem completamente das pautas, lides ou mesmo matérias mais rebuscadas.Estou recebendo estímulos externos que desconhecia completamente.

Sempre escrevi. Na adolescência por pura intuição, imitando poetas, tentando rimar com pouco sucesso. Não sabia a diferença ente prosa, verso, conto, crônica, um romance e muito menos que havia uma área que se dedicava a escrever poeticamente, com a alma, o coração, tudo real.

Aos quase 54 anos estou me permitindo este novo mergulho.

Ainda é cedo para qualquer avaliação mais profunda, Mas estou sendo bastante estimulada. Esses três exercícios que disponibilizo agora foram feitos em sala de aula em dez, 15 minutos e a partir de técnicas, exercitando a escrita total ou escrita rápida, conhecendo as relações que os textos têm com a literatura, psicologia humanista.

Mexendo e remexendo emoções que aparentemente estavam soterradas em algum lugar de nossa mente, muito bem guardadas e que devem vir à tona e serem registradas de imediato. Temos poucos minutos pra colocar no papel e sem computador. Tudo à mão em folhas que nem são brancas, mas de papel jornal.

O primeiro (Mãe interina) é resultado de um mergulho no álbum de família. Levamos para a sala de aula fotos consideradas importantes de fases de nossa história. Lá estavam mamãe, os irmãos, sobrinhos, Raul, Anaterra, Manoel e o Ivan Maciel Ribeiro, filho da Sula e que foi a minha experiência maternal verdadeira, real. A preocupação não é o literário, mas o registro, a emoção, o que pôde ser sugado desse álbum.

O segundo texto (“Paraíba”) foi resultado de um estímulo via um vídeo sobre a história do recomeço das águias. E o terceiro (O “mangueirão” particular) saiu, também em alguns pouquíssimos minutos, depois de um período de concentração que começou com uma música estilo cantiga infantil que mencionava os doces da vovó, as reuniões em família. Exercitamos o nosso jardim da criatividade a produzir textos luminosos.

Muito está sendo parido e quero dividir com os amigos que me acompanham aqui essa fase também.

Aguardo, ansiosamente, os comentários !

Mãe interina

Um filho interino que antes dos biológicos me permitiu exercitar a maternidade mesmo sem nunca amamentá-lo. Sua dor de barriga era também minha; seu machucado no rosto depois que o balanço da creche fora violentamente arremessado pelo coleguinha, também doeu em mim.

Mãe interina que aprendeu a amá-lo quando ainda estava na barriga da mãe; a ouvir sua primeira palavra (car) por volta de um ano. Noites acordadas embalando o filho quase meu. Praças, parques, feira livre, tudo era especial quando ele estava em minha companhia.

Os olhos claros, cabelos cacheados e uma saúde frágil tornavam-se coadjuvantes quando começava a falar, gesticular e didaticamente tentava convencer o ouvinte de que não seria jornalista apenas porque seu pai era, sua mãe também e até a mãe interina. Seria astrônomo.

- Não...astronauta não !, irritava-se aos cinco, seis anos quando confundiam profissões para ele tão distintas.

Os filhos biológicos chegaram e o aprendizado de mãe interina que dava banho, fazia papinha, limpava coco e se ajoelhava rogando a Nossa Senhora de Nazaré para que aquela febre tão alta não passasse de uma amigdalite, afastaram muitos dos fantasmas da mãe biológica de primeira viagem. O amor maternal já florescera antes da gravidez. Já conhecia o que era amar incondicionalmente.

O bebê se fez homem. Nem jornalista, nem astrônomo ou astronauta. Hoje é um engenheiro formado pelo ITA.

Orgulho da mãe uterina.

Orgulho da mãe interina.





O”paraíba”

Os abraços dos amigos no aeroporto eram de até breve. A pequena mala já indicava que a viagem seria curta. Mais do que visitar o pai no hospital, seria a oportunidade de conhecer a maior cidade da América Latina. Em um mês, no máximo, a rotina voltaria a predominar.

Já vira pela TV o trânsito infernal, os congestionamentos intermináveis, mas nunca se detera na rodoviária do Tietê. Que coisa mais louca ! Hora de pegar o metrô e ir até o Hospital A C Camargo. Reencontro difícil, mas necessário. Onde estava o brilho do olhar que há alguns meses o acompanhara na ambulância até o aeroporto ? E os cabelos prateados ? E o sorriso bonachão?

A esperança substituída pela dor ...

Poucos dias depois o fim do sofrimento e a hora da partida definitiva. O ser que um dia o carregara no colo agora inerte, precisava ser carregado por ele. E para o caixão !Era o único homem da família presente. Felizmente forte, saudável...

A casa nova estava nua. Nem quadros nas paredes, nem tapetes no chão ou plantas nas janelas. Uma geladeira, um fogão e colchonetes para amenizar a rigidez do piso frio.

Nova escola também, sem rostos familiares, sem as escadas de mármore, sem os vitrais centenários. O vestibular seria o mesmo...Talvez não. Um recomeço pela avaliação que só o confundia mais e mais. Estava entre os melhores da turma, mas o alijavam por ser um “paraíba”.

Venceria !

Queria !

Por ele, pela mãe, pelo pai que agora estava ali num canto da sala dentro de uma pequena caixa de cobre transformado em pó.

Aprovado na primeira faculdade, na segunda, na terceira, na quarta ...

O desejo era comemorar entre os seus amigos de tantos anos. Mas sabia que agora voaria mais alto, iria mais longe. Já não era um “paraíba”, mas, mais um universitário da USP.


O “mangueirão” particular

O ambiente da cozinha sempre foi marcante para nós. Após o jardim com grandes samambaias penduradas, flores nos vasos e enfeites com dizeres imitando placas que afirmavam enfaticamente: aqui vive uma família feliz ou aqui nois mora e nois veve, lá estava ela. 60 metros quadrados com predomínio de azul, uma grande mesa de sucupira bruta, oito cadeiras, fogão e um detalhe que a todos encantava: uma caixinha de som discreta e poderosa no canto direito reproduzia os CDs que eram colocados no som da sala. Cinco de cada vez. Música para pelo menos três horas ininterruptas.

Ali era o “Nosso Mangueirão”, alusão ao estádio de futebol de Belém. Os amigos e parentes nem se detinham mais na sala. Passavam direto para aquele cenário atraente que os recebia com algumas cervejas bem geladas e muito Chico Buarque, João Bosco ou Waldemar Henrique e que atingia seu ápice lá pelas 14 horas quando o almoço era servido. Ora um peixada de filhote, ora um tamuatá no tucupi ou o preferido de onze entre dez: a caranguejada que era antes de tudo um ritual que começava na semana anterior com as encomenda dos animais que, antes de serem sacrificados vivos em uma enorme panela com água fervendo temperada com cheiro verde, coentro e pimenta-de-cheiro-do-parám, passavam a noite se despedindo da vida em uma grande banheira velha com água corrente para que a lama desgrudasse de seus corpos.

Detalhes esquecidos quando chegavam avermelhados ao centro da grande mesa ...

2 comentários:

DORIS disse...

Beleza Cunhada!Apesar das perdas e das mudanças.A Ruth sempre tão intensa em tudo que faz,a dividiamos em Belém com tantos amigos,casa cheia,a Embrapa...Pra "nós"que gostamos tanto de ti,que vivenciamos muito do que escreves,é um prazer sempre ler o que escreves,eu acho que nem precisarias de cursos,mais nem ouso discutir isso rsrsrsrs.E ainda a "parir"vou sempre estar esperando pelo novo,pelas lembranças que vem de forma poetica,ou em forma de diario de adolescente,interrogações do viver,dos porques.Estarei aqui,como atenta e critica leitora,pq sei do que e do quanto és capaz.E que nasçam,que esses filhos sejam multiplicadores de opiniões e nos aproximem de ti.Beijo!!!!!

Mira Jatene disse...

Oi Ruth , que gostoso o texto mãe interina , muita emoção !
amei,
Mira