Quem sou eu

Belém/Ribeirão Preto, Brazil
Amazônida jornalista, belemense papa-xibé. Mãe, filha, amiga... Que escreve sobre tudo e todos há décadas. Com lid ou sem lid e que insiste em aprender mais e mais... infinitamente... Até a morte

Aos que me visitam

Sintam-se em casa. Sentem no sofá, no chão ou nessa cadeira aí. Ouçam a música que quiser, comam o que tiver e bebam o que puderem.
Entrem...
Isso aqui está se transformando em um pedaço de mim que divido com cada um de vocês.
Antes de sair me dê um abraço, um afago e me permita um beijo.

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terça-feira, 31 de março de 2009

Meu mundo interior

Já consigo visualizar com relativa facilidade meu mundo exterior. Andei muito, corri demais, me perdi em muitas estradas vicinais, mas aos poucos percebo que externamente arrumei o que estava embaralhado pelos recentes acontecimentos. Muita coisa come;a a fazer sentido de novo.
A casa que há alguns meses se limitava a dois colchonetes gentilmente cedidos pela cunhada Doris e umas poucas louças descartáveis, agora tem tudo o que considero essencial para uma vida sem luxo, mas agradável, confortável, com aminha cara. Meu cantinho, de meus filhos e de minha mãe está novamente aconchegante. Apenas algumas caixas que vieram de Belém ainda impedem a arrumação completa. Material que veio da Embrapa, caixas e mais caixas de recordações minhas e do Manoel. Agendas de cinco, dez anos atrás; crachás que demonstram o quanto mudamos; meus inseparáveis caderninhos de anotações; fotografias, textos, documentos e muitas, muitas lembranças.
A alguns quilômetros também consegui arrumar o cantinho do filho. Simples, mas suficiente para abrigá-lo de segunda à sexta-feira. Está se sentindo homem, adulto, embora em uma doce e profunda conversa neste último final de semana tenha ressaltado que liberdade a gente não ganha, não compra, não rouba, conquista-se e, mesmo morando só, a sua liberdade ainda não foi conquistada. Por isso telefono tanto, por isso quero saber onde e com quem anda, o que faz. Se comeu, se dormiu bem. Se não está doente... Aos poucos sei que essas preocupações serão reduzidas. Na verdade já estão sendo ... Nas primeiras noites mal conseguia dormir só de saber que ele estava tão longe, sozinho em um quarto. Agora durmo, sonho e acordo bem. Apenas rezo mais. Peço a Deus, à Nossa Senhora de Nazaré que o proteja sempre, que nunca tire os olhos dele, que não permita que pessoas que possam fazer mal a ele se aproxime e que lhe dê sempre o discernimento para optar pelo bem.
No trabalho também começo a ter uma rotina, afazeres mais prazerosos, descoberta de pessoas interessantes, embora a comparação com a Unidade de Belém seja inevitável. O ritmo é diferente, as atribuições, responsabilidades e reconhecimentos bem menores, mas que tem seu lado bom: estou cuidando mais de mim, incluindo nesse cotidiano a academia e caminhadas pela manhã aproveitando a temperatura agradável de São Carlos que nem nos deixar suar. Ando cada dia por uma rua diferente, explorando casas, pessoas, cachorros, gatos. Uma cidade que ainda é tão nova e que me dá de presente um desconhecido roteiro matinal de agasalho nunca antes usado.
Preciso, porém, agora parar de fugir, reduzir a velocidade externa e olhar de frente meu mundo interior. Esse sim desarrumado, precisando ser colocado de novo de pé.
Muitas vezes paro e tento ver como era a minha vida um ano atrás, dois anos atrás exatamente naquela mesma data. Certamente muito mais intensa, muito mais cansativa, mas muito mais feliz. Tinha planos, tinha sonhos e pessoas no meu dia-a-dia que me completavam de uma forma que talvez só eu entenda.
Viajar, mesmo a trabalho, representava oportunidades de crescimento profissional e pessoal. Reencontrar pessoas amadas, rir, brincar, passear e ir além de mim mesma. Não estava tão frágil, tão carente e facilmente impactável. Não tinha tanto medo de sofrer, de perder, de me dar.
Meus sentimentos ainda me assustam e me enfraquecem. Rio pouco, sonho quase nada e apenas vivo o dia sem muito entusiasmo, tentando encontrar a esperança perdida. Nem mesmo tomar uma cerveja, cozinhas, ouvir o Chico ou sair pra bater um papo me encanta mais.
Não sei onde estão as pessoas que amo. Perdi o referencial de amar, de querer ter perto, de sentir prazer.
Estou árida de emoções.
Às vezes sinto que posso me reestruturar integralmente, que um dia talvez volte ver a vida com os olhos do otimismo, que viver não me pareça apenas ver os dias se arrastarem um atrás do outro.
Sorrio, me arrumo, me perfumo, me maquio, beijo e abraço abraço pessoas, mas por dentro já não me vejo tão acessível simples.
Quando olho pra trás sinto saudade de mim. Da leveza de meus pensamentos, da ternura de meus sentimentos, da exequidade de meus planos.
Queria muito acreditar ser possível retomar de onde parei, recarregar as baterias, rearrumar meu mundo interior e acreditar que estou viva, latente, sedenta de emoções e de novo de braços abertos à felicidade.
Enquanto isso não acontece mudo os móveis de lugar, pinto uma nova parede, cuido das plantas e organizo o que está mais visível aos olhos.
Vou à academia, ao analista, ao cabeleireiro, ao shopping, ao supermercado
E os dias vão passando... anoitecendo.. amanhecendo... anoitecendo de novo... amanhecendo de novo...

terça-feira, 24 de março de 2009

Preciso escrever .. me encontrar.. renascer

Estou sentindo um grande vazio e uma necessidade imensurável de escrever, de arrumar sentimentos, de entender emoções, de aliviar a ansiedade, de buscar no mais íntimo de mim o que me parece nem existir.
Talvez achar a Ruth que se perdeu no caminho.
As tarefas que inicialmente pareciam ser bem menores em uma cidade mais tranqüila, o dia-a-dia que tinha tudo pra ser mais prazeroso, menos estressante de repente se mostra tão ou mais efervescente e inadministrável. Deve ser o peso da responsabilidade ou a constatação irrefutável de que nada é mais como antes.
Tenho estado extremamente perturbada com a vida “nova” que se abriu diante de mim. Algumas vezes brindo a oportunidade de estar em outra cidade, conhecendo novas pessoas, experimentando e comparando o novo com minhas raízes e quase sempre constatando que Belém, definitivamente, está há muito abandonada. É uma junção de governos individualistas e irresponsáveis que deixam agora à mostra para o Brasil inteiro a podridão das feridas da segurança (?) pública, da saúde, da educação, do transporte...
Sinto saudade, mas não quero voltar !
Difícil mesmo é me aceitar. Vejo-me mais fria, mais egoísta, menos generosa, menos humana. Talvez esteja me vendo como nunca me vi. Um espelho que mostra que sou também frágil e que se controlo os que amo não o faço por mal, mas que não faz bem a ninguém. Tenho medos, inseguranças, desamores, decepções e muitas, muitas frustrações.
Estou petrificada diante de um ser que se pergunta insistentemente a ponto de doer a cabeça ou não dormir e que caminha a passos lerdos em busca de não sei o quê e nem para onde. Meio sem rumo, meio perdida.
Enxergando a mim e às pessoas provavelmente como elas sempre foram, mas que meu mundo colorido não me permitia ter essa visão grotesca e assustadora.
Afinal que respostas busco ? Sei de antemão que o Manoel não voltará, mesmo que o veja em breves alucinações na multidão dos shoppings ou mesmo chegando em casa; os amigos de Belém já não me telefonam pra sair, pra participar de eventos e os poucos que ainda me procuram cada dia mais os contatos ficam espaçados; o trabalho já não é prazeroso, perdi minhas referências, mudei e encontrei pessoas diferentes, uma diversidade que passa pelo cultural e me choca, me surpreende, me assusta e me entristece.
Sinto-me desanimada e cansada. Exigente demais comigo e com as pessoas, não tolerando tanto, não aceitando pacificamente, não sendo a compreensiva de sempre. Me desconheço ao final do dia. Exausta de não sei o que, infeliz não sei porque e descrente de que ?
O analista que começo a frequentar acredita que há muitos motivos para eu me sentir assim. Voltei à psiquiatria para, através da ciência, talvez encontrar algumas explicações. Perda do marido-companheiro-paizão, retirada brusca de meu chão, minhas raízes, falta de adaptação no trabalho, mudança do filho para outra cidade, afastamento dos amigos. Ele acha muito ! Eu também, mas sei que preciso viver cada dia de uma vez e entender que nada mudará. Este é meu “novo” mundo.
Tento me habituar a este novo cenário. A casa que parece uma réplica de Belém está bonita, mas não tenho o mesmo entusiasmo de antes; os colegas de trabalho são pessoas interessantes, mas dificilmente serão amigos; o Raul já não dorme e acorda na mesma casa que nós e já não produzo como antes profissionalmente.
Tenho ainda me defrontado com pessoas que há muito estão na minha vida e que só agora pareço de fato conhece-las. Eu era cega ou estou vendo o que não existe ?
Estou sensível demais e intolerante para palavras, atos, gestos.
Relevava mais...
Percebo-me impaciente, intolerante e buscando incessantemente uma paz que parece cada dia mais distante.
Nem mesmo as aulas que estou ministrando, o convite para continuar na diretoria da Associação Brasileira de Jornalismo Científico, os passeios que estou tendo oportunidade de fazer, os lugares novos que tenho o privilégio de conhecer tem me encantado ou as conquistas dos filhos que me enchem de orgulho, mas parecem também difíceis de serem digeridas, já que significam uma nova partida, um novo corte de cordão umbilical.
Uma noite qualquer, onde o tempo sobrava e o gato preto que nos acompanha desde Belém veio se deitar ao meu lado na cama, pensei alto (ou talvez tenha conversado com ele): o Manoel já não deita mais aqui, o Raul está longe, a mamãe já dormiu e a Anaterra está lá, no outro quarto, envolvida com a amiguinha. É Nhau .. só sobrou você !
Fiquei com raiva de sentir piedade de mim, de não entender que esta é uma fase, que é preciso eu insistir e superá-la. Viver esse presente que não é tão ruim assim, priorizar o que há de bom, esquecer dos que me incomodam, deletar os que me fazem mal e brindar aos que ainda existem, ao que ainda restou.