Quem sou eu

Belém/Ribeirão Preto, Brazil
Amazônida jornalista, belemense papa-xibé. Mãe, filha, amiga... Que escreve sobre tudo e todos há décadas. Com lid ou sem lid e que insiste em aprender mais e mais... infinitamente... Até a morte

Aos que me visitam

Sintam-se em casa. Sentem no sofá, no chão ou nessa cadeira aí. Ouçam a música que quiser, comam o que tiver e bebam o que puderem.
Entrem...
Isso aqui está se transformando em um pedaço de mim que divido com cada um de vocês.
Antes de sair me dê um abraço, um afago e me permita um beijo.

Arquivo do blog

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Incertezas

Ao que parece não terminam as novidades, não desaceleram os obstáculos, não reduzem as tempestades. Cada dia uma nova, cada momento algo a pensar, a decidir, a esperar. Sinto que me faltam forças diante de tantas incertezas...
Esta semana foi carregada demais. Primeiro a radioterapia. Comemorei a volta dela na segunda-feira. Mas na terça de novo o aparelho parou. Minhas dúvidas sobre continuar só aumentaram. Fui em busca de palavras sábias, de pessoas em quem confio pela inteligência, discernimento, conhecimento e sobretudo generosidade de espírito. Conversei com médicos e a recomendação foi interromper. Pouco ou nada significa prosseguir desse jeito. A própria médica do Ophir Loyola explicou que os efeitos são acumulativos por apenas 48 horas, mais do que isso pode haver comprometimento. Se o parelho pára com freqüência, se a maioria não consegue fazer as aplicações ininterruptamente significa então que o que está sendo oferecido aos pacientes é uma grande farsa. Nem quero pensar que isso pode ser verdade !
O que me é particular está acima do que o aparelho velho e barulhento me oferece: não confio mais das radiações, nos operadores da máquina, nas pessoas que me atendem. Um tratamento sem fé, sem energia positiva, sem crença é inútil. Tenho plena consciência da sua inutilidade. Serviu apenas para que eu sentisse alguns incômodos como dores lombares principalmente no pescoço; um pouco de dificuldade para respirar, cansaço e uma enorme vontade de ficar deitada. Mas o pior mesmo é constatar que minha querida Belém está entregue às baratas.
Amigos me recomendaram ir ao Ministério Público denunciar, buscar meus direitos, mas estou cansada, estou exausta de tanto pensar, de buscar soluções para os nossos problemas. Desestimulada, decepcionada, enfraquecida. O que eu mais queria era prosseguir o tratamento, fazer todo em Belém e depois seguir para SP só para avaliações e para cuidar do Manoel. Infelizmente não será assim.
Tentarei reatar os contatos com a clínica de Campinas onde fizera a marcação em abril. Mas o médico que me atendeu no Ophir Loyola, sem eufemismos me preveniu: a maioria dos radioterapeutas não gosta de prosseguir um tratamento que foi iniciado por outro. Argumentei que meu caso era especial, acho que único mesmo, mas nem isso o sensibilizou. Não liberou meu relatório médico e disse que só o fará se eu tiver o aceite da clínica de Campinas. Recomendou-me ainda a deixar Belém e sem cerimônia afirmou: se a senhora pode se tratar em outro lugar, vá !! Quem pode não fica aqui.
Escrevi uma mensagem para os médicos, relatei minha odisséia, expliquei minha situação atípica e quase implorando, pedi que me aceitassem de volta. Ansiosamente rezo e aguardo pela posição deles.
Sei apenas que preciso ir para o Estado de São Paulo. Não sei por quanto tempo, não sei como será a nossa vida, mas aqui está insuportável. Penso no Manoel e nas dificuldades talvez intransponíveis que terá que enfrentar para se tratar. Se o meu caso, aparentemente simples que chegou mesmo a ser banalizado por algumas pessoas, não tem guarida em Belém, imagine uma leucemia mielóide aguda que é tão complexa, tão perigosa. Ele não pode voltar enquanto não tiver condição plena de apenas monitorar a doença. Ele também precisa de nós. Um mês se passou e ele está frágil, chora com facilidade e se emociona demais.
O tratamento já chegou na segunda etapa. Acabou a quimioterapia de uma semana ininterrupta e agora ele espera pela reação de seu corpo, pela resposta de seu organismo. Algumas já apareceram. O cabelo, que fora raspado, mas começava a nascer, está caindo; cólicas intestinais obstruem as fezes; a boca está ferida e emocionalmente está frágil. É tão difícil acompanhar tudo isso de longe. Nos falamos pelo menos uma vez por dia e trocamos muitas mensagens pelo celular. Insuficiente, porém.
Ele parece não querer ver com nitidez o que está vivendo. Acredita que em breve estará de volta tomando a sua latinha com caranguejo toc-toc em companhia dos amigos-vizinhos. Acredita em uma alta próxima e um retorno à vida normal. Mas eu sei que não será assim.
Somos muito diferentes. Até nesse aspecto. Minha patológica ansiedade antecipatória, meu desejo incontrolável de entender tudo, de me deixar envolver pelo que estou vivendo, leva-me a viver tudo no mais extremo. Exagero sempre !! Vou até o outro lado do túnel, visualizo meu cenário fictício, sofro diante do mais trágico e me preparo para a guerra. Luto com unhas e dentes e talvez por isso sofra tanto. Por outro lado, quando a realidade se mostra mais leve do que a minha fantasia, vibro, comemoro, relaxo e sinto-me forte para enfrentá-la. Meus monstros são sempre mais ferozes.Diferente do Manoel que vê o mundo cor de rosa, evita se aprofundar para não sofrer, prefere desconhecer para não ter que lutar. De novo esse jeito quase infantil de viver se manifesta.
Pessoas assim certamente sofrem menos. Apenas no momento da dor é que ela se apresenta de fato, apenas quando a tragédia se instala é que se tenta administrá-la. Por outro lado, contudo, não se preparam, não trabalham com hipóteses, não medem as conseqüências dos atos, não sofrem diante dos diferentes cenários que a imaginação permite serem construídos. Não dá pra dizer o que é melhor ou pior.
Minha única certeza é que não tenho certeza de nada. Mais do que nunca a vida está me levando. Tudo tão incerto, tão imprevisível que fico meio sem direção. Só não tenho dúvida das minhas três prioridades neste momento: a minha saúde e a do Manoel e os estudos dos meninos.
Poderia ir para SP e fazer meu tratamento ao lado dele, deixando Raul e Anaterra aqui. Mas não conseguirei. Minha relação com eles é forte demais. Melhor não fosse assim. Deixá-los com a mamãe, Rulton ou Ruthlene poderia ser uma alternativa, mas eu não ficaria bem. Nem eles. Prefiro esperar o final do semestre letivo e irmos os três. Ficarei fortalecida ao lado deles e de alguma forma nós quatro nos reuniremos novamente mesmo que seja em um quarto de hospital.

Um comentário:

Anônimo disse...

Rutissima,
Carinho do norte ao faltara a vcs aqui em Campinas.
Sumara